Sustentabilidade Amazônica

Instituto Mamirauá

30 de maio de 2020

Tecnologias sociais agregam valor e melhoram condições de trabalho

 

 

Em abril deste ano, o Instituto Mamirauá completou 21 anos. Ganhou maioridade. Não pôde celebrar a data, devido a pandemia de coronavírus. Mas comemorou e comemora sim, todos os dias, com os resultados de um trabalho sério e dedicado que começou em abril de 1999 com o ecologista José Márcio Ayres (1954 – 2003)
 
 
Aos 21 anos, Mamirauá relembra histórias de maior impacto na conservação e qualidade de vida de ribeirinhos. Em abril, o Instituto Mamirauá, organização social vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC), completou 21 anos. Diante do contexto dramático que vive o Amazonas, a direção optou por não celebrar a data. Em vez disso, priorizou-se o lançamento da primeira plataforma de monitoramento em tempo real da doença no Amazonas. “Entendemos que o momento é de reafirmar nosso compromisso com a ciência e a resiliência das comunidades tradicionais da Amazônia. Por isso, nos próximos dias, vamos publicar uma série de histórias que impactaram positivamente na conservação da biodiversidade e na qualidade de vida das populações, condições essenciais para evitar que zoonoses sejam transmitidas aos seres humanos e para enfrentar doenças como o Covid-19”, relevou a direção do Instituto.
 
 
TECNOLOGIAS SOCIAIS
 
Sustentabilidade usando recursos da região e os conhecimentos tradicionais da comunidade. Isso faz a diferença. Para a diretora de manejo e desenvolvimento do Instituto Mamirauá, Dávila Corrêa, aperfeiçoar o trabalho não significa necessariamente negar o modelo tradicional de produção. “Agregar ao conhecimento tradicional as boas práticas de produção, mais higiênicas, eficientes no uso de recursos naturais e com impactos positivos na saúde e qualidade de vida dos produtores representa muito da missão do Mamirauá de aliar ciência às técnicas tradicionais dos povos da região”, afirma Dávila Corrêa.
 
Dávila explica que tudo começa com a instalação de um sistema de captação da água da chuva e a instalação de diversas caixas d'água usadas para deixar a mandioca de molho. Antes, o processo de lavagem e amolecimento da mandioca era feito por agricultores, muitos deles adultos e idosos, que permaneciam durante dois ou três dias com as pernas mergulhadas nos igarapés, com isso muitos agricultores relatavam muitas dores nas pernas e articulações, que se agravavam com os anos.
 
Além de ajudar nesse processo, o sistema de captação de água da chuva também alimenta as áreas de higienização e sanitários, que não estão presentes na maior parte das casas tradicionais de farinha. Uma prensa desenvolvida com macaco hidráulico reduz agora o esforço físico necessário para prensar a mandioca, que depois segue para os processos de secagem, beneficiamento e torragem.
 
 
VIVENDO DA MADIOCA E DA UARINI
 
Muito diferente das farinhas de mandioca consumidas em outras regiões do país e indispensável na mesa de qualquer amazonense, a farinha Uarini atrai hoje a atenção e o interesse de “chefs” renomados da gastronomia nacional e internacional. Produzida por comunidades ribeirinhas do Médio Solimões, no estado do Amazonas, ela é o sustento de centenas de famílias na região.
 
Pensando em aumentar a renda e a autonomia dos produtores, melhorar suas condições de trabalho e atender essa demanda de paladares exigentes, agregando valor ao produto, o Instituto Mamirauá desenvolveu um modelo de casa de farinha que, enquanto preserva a técnica artesanal, inova no uso de tecnologias sociais e energia limpa.
 
Uarini está na boca do povo. E está em tudo quanto é mercado de Manaus e de Tefé. Está em muitos lugares na imensidão do Amazonas. É obrigatória. Se faltar, tem briga. É democrática. Vai na receita de “chef” e no prato popular. Acompanha carne, frango, peixe. Vai bem com açaí. De tão boa, faz as vezes de moeda. Troca-se Uarini por filé de pescado. Uarini é um lugar com mais de 13 mil pessoas. Uma comunidade que deu nome a uma farinha. 
 
Dentro da reserva Mamirauá, a maior área de preservação ambiental do Brasil, cerca de 2 mil agricultores vivem do cultivo da mandioca. O processo de transformação em farinha é todo artesanal. Depois de colhida, a mandioca fica imersa em água de dois a três dias até amolecer, fermentar e descascar. Por isso, ela é um tipo de farinha d’água.  
 
 
CIÊNCIA ALIDA À TRADIÇÃO
 
 
 
Produzida por comunidades ribeirinhas do Médio Solimões, a farinha Uarini é o sustento de centenas de famílias na região. Vai na receita do chef ao prato popular. Acompanha carne, frango, peixe. Vai bem com açaí. De tão boa, faz as vezes de moeda. Troca-se uarini por tudo.
 
 
 
MELHORIAS NA ESTRUTURA
 
Uma das maiores queixas dos produtores referia-se à inalação de fumaça durante a torragem da mandioca. Os novos fornos ecológicos, além de possuírem chaminé, economizam lenha e permitem o controle manual da temperatura do forno, que, dizem, é o segredo da farinha Uarini.
 
Segundo Fernanda Viana, coordenadora do Programa de Manejo de Agroecossistemas do Instituto Mamirauá, o uso de tecnologias sociais no melhoramento das casas de farinha foi pensado para beneficiar especialmente famílias de pequenos agricultores familiares, que muitas vezes não tem oportunidades de comercializar sua farinha para mercados diferenciados, por não terem o mesmo acesso aos recursos necessários para construir uma capacidade mínima de instalação, que atenda aos padrões exigidos.
 
“O que eu espero com essa iniciativa das casas de farinha é que a gente venha a ganhar mercado, e dizer que esta farinha com a qual estamos trabalhando é de boa qualidade, e fazer um bom trabalho para alcançar um ganho a mais” diz Edna Rocha Lopes, uma das agricultoras beneficiada pelo projeto.
 
A farinha Uarini, também chamada de farinha ova ou farinha ovinha, é reconhecida pelos consumidores pela sua crocância, coloração amarelada e pela forma arredondada dos seus grãos, que se assemelham a uma ova de peixe. Após a conquista do selo, ela passa a se diferenciar das demais farinhas do mercado também porque sua produção promove a conservação do meio ambiente, por ser produzida de forma agroecológica, fortalecendo a produção limpa (livre de agrotóxicos) e justa (por valorizar o pequeno agricultor e seu modo tradicional de produção).
 
A delimitação geográfica do selo compreende os municípios de Uarini, Alvarães, Tefé e Maraã, onde o cultivo da mandioca e a produção de farinha estão fortemente enraizados na cultura local. Não é permitido o uso de agrotóxicos ou outros insumos agrícolas externos, a não ser os autorizados na Lei de Orgânicos. Com a replicação desse modelo de casas de farinha e o impacto visível na geração de renda e qualidade de vida, o próximo passo é a conquista da certificação orgânica, que já está sendo demandada pelas famílias da região. 
 
 
 
 
 
O Instituto Mamirauá concluiu o projeto 'Energia Solar para Inclusão Digital' inclusive com a capacitação de pessoas de São João do Ipecaçu, na Reserva Amanã (AM). Pelo projeto, a comunidade teve pela primeira vez acesso à internet.
 
 
 
 
 
Com o senador Eduardo Braga, a diretora de Manejo e Desenvolvimento do Instituto Mamirauá, Dávila Corrêa, e a coordenadora do Programa de Pesca, Ana Claudia Torres, discutem o fortalecimento da cadeia produtiva do pirarucu.