Medicina da floresta: pesquisador usa uxi amarelo, unha de gato, marapuama e outras plantas para tratamentos no AM

29 de maio de 2021

Pesquisador do Inpa realiza pesquisas há quatro décadas sobre o uso de plantas tradicionais em tratamentos contra cistos nos ovários, endometriose e miomas, entre outros.

Por Eliana Nascimento, G1 AM

 

Juan Revilla é pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/ MCTI) — Foto: Luciete Pedrosa/Ascom Inpa

Juan Revilla é pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/ MCTI) — Foto: Luciete Pedrosa/Ascom Inpa

Foi por meio dos relatos dos avós ainda na infância que o pesquisador e doutor em Botânica Econômica Juan Revilla, de 71 anos, começou a se interessar em estudar as plantas medicinais. O peruano hoje desenvolve seu trabalho na Amazônia Brasileira, onde veio estudar e tratar pacientes há mais de quatro décadas .

Juan Revilla é pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), onde trabalha há 43 anos. Ao G1, o pesquisador explicou que concentra seus estudos nas plantas nativas já usadas popularmente por moradores da Região Amazônica, como uxi amarelo, unha de Gato, marapuama, entre outras.

Revilla explica, por exemplo, que pesquisa sobre problemas de cistos nos ovários, miomas, nódulos nos seios e endometriose com tratamentos a partir do uso dessas ervas.

Atualmente, o doutor se divide entre duas cidades para realizar pesquisas. Em Manaus, ele atua no Instituto de Medicina Tradicional e, sempre que pode, viaja ao município de Manaquiri, onde também trabalha com plantas medicinais.

Revilla explicou que a primeira frente de sua pesquisa é sobre o levantamento das informações das plantas medicinais da Amazônia. A segunda é a orientação no uso de plantas medicinais pela população.

“Muita gente pensa que o trabalho com plantas medicinais era apenas feito por curiosos, por amantes da natureza, mas não. Hoje em dia, no Brasil, no Peru e no mundo, há pesquisadores, doutores na área de plantas medicinais e medicamentos fitoterápicos. Existe um rol de conhecimentos e publicações que justificam a eficácia das plantas medicinais”, contou.

O pesquisador comentou que a Amazônia brasileira possui inúmeras plantas que curam e que poderiam ser vendidas para o mundo, mas apenas se conhece o uso de poucas.

“Para nós, é gratificante saber que as plantas da nossa Amazônia podem ajudar a tratar doenças que a medicina ainda não consegue resolver. Um exemplo: miomas, endometriose, alterações de hormônios em geral. Não existem medicamentos consistentes que possam revolver isso, mas a natureza nos mostra que há um caminho”

 

Pesquisador Juan Revilla em Manaquiri antes da pandemia  — Foto: Ascom/INPA

Pesquisador Juan Revilla em Manaquiri antes da pandemia — Foto: Ascom/INPA

 

Plantas medicinais da região amazônica

Uxi Amarelo: Originada da Amazônia brasileira, possui efeitos anti-inflamatório, antioxidante, diurético e estimulante imunológico. O pesquisador explicou que costuma se vender em forma de casca (retiradas de troncos de árvores). A planta é usada no tratamento de vários problemas de saúde, como no tratamento de miomas; cistos no ovário ou no útero; combate a infecções urinárias; promove a regulação do ciclo menstrual causada pela Síndrome dos Ovário Policísticos, também ajuda no tratamento endometriose.

Uxi Amarelo se mostra eficaz no tratamento de vários problemas de saúde — Foto: Ricardo Oliveira/Fapeam

Uxi Amarelo se mostra eficaz no tratamento de vários problemas de saúde — Foto: Ricardo Oliveira/Fapeam

“O Uxi Amarelo corrige os estudos hormonais. Hoje se conhece toda a química dessa planta e sabemos quais os princípios ativos que fazem esse trabalho. Para a indústria farmacêutica, é um fracasso, a dificuldade de fazer sínteses desses compostos. É interessante o extrato seco de Uxi Amarelo. O extrato seco não é a casca moída, é o chá sem água. E que pode se transformar em comprimidos”, explicou Revilla.

Unha de Gato: Encontrada principalmente na Floresta Amazônica e em outras regiões da América do Sul, começou a ser usada pelos indígenas de forma medicinal para tratamentos inflamatórios e degenerativos. É uma planta que tem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

“A Unha de Gato tem um histórico mundial fantástico. É uma planta que corre na Amazônia Brasileira e nós temos uma quantidade imensa desse produto que precisa ser mapeado e ser estudado no campo para ver a dimensão da produção da unha de gato e poder transformar em medicamento. É também outra planta que estamos trabalhando aqui para transformá-la em comprimidos”, contou o pesquisador.

Marapuama: Planta medicinal originada na Amazônia. Serve para melhorar a circulação sanguínea, tratar a anemia e disfunções sexuais. “É outra planta que considero muito importante, assim como o Mirantã, a Marapuama trabalha com o sistema nervoso. Essas plantas, nós estamos trabalhando alguns anos, e hoje nós sabemos de alguns componentes químicos”, explicou o pesquisador.

 

Clínica de campo para o tratamento de doenças crônicas

Pesquisador Juan Revilla em campo botânico em Manaquiri, antes da pandemia  — Foto: Ascom Inpa

Pesquisador Juan Revilla em campo botânico em Manaquiri, antes da pandemia — Foto: Ascom Inpa

Com a pandemia, Revilla disse que teve a oportunidade de se dedicar muito mais ao campo, em Manaquiri, no interior do Amazonas. Com recursos próprios e colaboração de outras pessoas, ele conseguiu mais recursos para sustentar colaboradores, que atualmente conta com 15.

Segundo Revilla, os colaboradores preparam os ambientes físicos e paisagísticos do projeto da construção de uma clínica em Manaquiri que conta com três pontos importantes:

1 “O primeiro é o laboratório para a fabricação dos medicamentos, quase concluída esperando alguns equipamentos”;
2 “O segundo é o jardim botânico de plantas de valor econômico, chamada Botânica Econômica Garden. Esse Jardim Botânico tenta mostrar aqui essas plantas com potencial econômico. Hoje nós estamos com mais 1600 plantas já instalada em nosso jardim”;
3 “O terceiro é o trabalho de atendimento. Nós estamos montando uma clínica de campo para o tratamento de doenças crônicas que pode ser inaugurado no fim do ano.

 

Falta de financiamento

O pesquisador reclamou da falta de financiamento para desenvolver seu trabalho. Para ele, atualmente, a contribuição das plantas medicinais para a saúde é de grande valia, mas lamentavelmente, a população não sabe muito sobre o Inpa, o instituto de pesquisa em que trabalha.

“Não recebemos recursos para realmente fazer a pesquisa e a transformação. Eu como botânico, eu fiz meu trabalho publicando sobre plantas amazônicas. Mas não adianta deixar esse livro na prateleira e não transformar isso em medicamentos que poderiam servir para nossa população local, para o Brasil e para o mundo”, disse.