Bendita Cera de Carnauba
29 de junho de 2021Carlos Alberto dos Santos, físico e professor do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS. Foi Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da UNILA – Universidade Federal da Integração Latino-Americana.
Mais importante do que evitar a dispersão dos materiais é o fato de que essas cápsulas aumentam o fator de proteção solar quando comparado com aquele do óxido de titânio isolado. Ainda não se sabe a que se deve esse fenômeno. Pode ser que isso tenha a ver com a composição química da cera de carnaúba.
De tempos em tempos a cera de carnaúba, que só existe no Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte, nos apronta uma surpresinha. Aparentemente, a primeira aplicação em tecnologia de ponta da cera de carnaúba se deu em 1890, quando Charles Sumner Tainter (1) a usou para preparar a superfície de um cilindro de gravação fonográfica.
Depois disso, o momento de glória seguinte foi no início dos anos 1940, quando Joaquim da Costa Ribeiro (2) utilizou uma mistura de cera de carnaúba, cera de abelha e outras resinas naturais para fabricar um material dielétrico do tipo eletreto. Com este material ele descobriu o efeito termodielétrico, que hoje é conhecido como efeito Costa Ribeiro.
Atualmente, são inúmeras as aplicações industriais da cera de carnaúba. Em algumas dessas aplicações, ela é utilizada pela mesma razão que motivou o uso nos filtros solares: a de ser a mais resistente entre as ceras naturais. Por exemplo, os compostos aromáticos são geralmente caros, delicados e voláteis. Uma forma de preservá-los é por meio do encapsulamento com cera de carnaúba.
As propriedades que fazem da cera um material apropriado para uso em cobertura e encapsulamento, são usadas pela natureza para proteger e dar vida à carnaubeira.
As frutas cítricas perdem peso por causa da transpiração. Isso pode ser minimizado cobrindo o fruto com uma fina camada de cera de carnaúba. Diversos produtos da indústria alimentar são conservados por meio desse tipo de cobertura. E, obviamente, cera de carnaúba é largamente utilizada na composição de inúmeros produtos lubrificantes, fios dentais, cobertura de balas comestíveis, entre outros.
Finalmente, uma observação nada surpreendente, mas interessante. As propriedades que fazem da cera um material apropriado para uso em cobertura e encapsulamento, são usadas pela natureza para proteger e dar vida à carnaubeira. Como a árvore cresce na árida região nordestina, ela tem que utilizar, com a maior eficiência possível, a água dos poucos dias chuvosos.
Para evitar que a água acumulada em seu caule e nas suas folhas se evapore em consequência da tórrida insolação, a natureza providencia que a cera se espalhe por todas as partes, formando esta camada protetora – para a qual o homem encontrou tantos outros propósitos.
(1) Charles Sumner Tainter – Nasceu em Watertown, Massachusetts, 25 de abril de 1854. Faleceu em San Diego, 20 de abril de 1940. Engenheiro, industrial e inventor de instrumentos científicos. Colaborou com Grahan Bell e inventou o primeiro gravador de voz, o gramofone.
(2) Joaquim da Costa Ribeiro (1906-1960) Engenheiro civil, mecânico e eletricista pela Escola Nacional de Engenharia. Joaquim da Costa Ribeiro se tornou docente da recém-fundada Universidade do Brasil (atual UFRJ). A primeira publicação de Costa Ribeiro tem o título: “Sobre a eletrização da cera de carnaúba na ausência de campo elétrico exterior”. Ganhou o Prêmio Einstein e ele próprio virou prêmio: Prêmio Joaquim da Costa Ribeiro, outorgado pela Sociedade Brasileira de Física.