licenciamento ambiental

Licenciamento ambiental fica (PL 3.729/2004)

1 de julho de 2021

O PL prevê regras procedimentais, sem fragilizar a rígida legislação ambiental em vigor

Horácio Gris

A Lei Geral de Licenciamento Ambiental - Visão Agro

 

Finalmente avança no Congresso o Projeto de Lei 3.729/2004, o PL da lei geral do licenciamento ambiental. Uma lei esperada há 40 anos, desde que o Poder Executivo passou a ocupar o espaço do Legislativo na formatação da política ambiental.

Com a aprovação do PL na Câmara, começaram as críticas alarmistas e desleais. Oposicionistas de sempre, colocando defeito em tudo, mas incapazes de dialogar e apresentar soluções.

Há um cansaço generalizado nessas atitudes destrutivas, com muitos apenas querendo um palco para chamar de seu. Por que a mídia ainda concede tanto espaço a esse sensacionalismo, que a qualquer milímetro de avanço na legislação ambiental faz explodir matérias e artigos dizendo que “tudo será destruído”, “que será o desmonte completo de tudo”?

Ouvimos esses lamentos há mais de 25 anos e o fim do mundo parece cada vez mais distante, embora a legislação ambiental esteja cada vez mais confusa e assistemática.

É muito descompromisso com a realidade. Quem as divulga, e a maior parte de quem as lê, fica perdido no meio dessa cortina de fumaça.

É dever, portanto, de quem realmente entende do assunto e quer ver o país se desenvolver da forma mais correta possível, colocar os pingos nos is. Então vamos lá.

O licenciamento ambiental é um processo administrativo conduzido por um órgão ambiental e tendo como maior interessado o solicitante da licença (empreendedor).

Para disciplinar esta relação “órgão licenciador/empreendedor”, é preciso uma lei, assim como existe lei disciplinando os demais processos administrativos, desde a liberação de alvará de construção, a discussão de multas tributárias ou de trânsito, a realização de licitação etc.

No âmbito federal, o licenciamento ambiental até hoje não tem lei. Suas regras são disciplinadas por decretos, resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente, portarias e outros atos, sempre com enorme carga de dúvidas sobre a validade jurídica.

Boa parte dos Estados e Municípios possuem leis próprias sobre o assunto, e, mesmo com 99% das licenças ambientais sendo emitidas por estes entes, é preciso uma lei nacional definindo normas gerais aplicáveis a todos os âmbitos da Federação. Este é um dos únicos consensos entre todos que elogiam ou criticam o PL.

O PL prevê regras procedimentais que definirão direitos e deveres do órgão licenciador e do empreendedor no curso do processo de licenciamento ambiental. Nada, absolutamente nada, interfere no restante da legislação ambiental em vigor.

O patrimônio ambiental brasileiro é protegido por leis ambientais específicas, o que no jargão jurídico são chamadas de leis materiais. São exemplos as leis 11.428/2006 e 12.651/2012 (protegem a mata atlântica e demais florestas e formas de vegetação), 9.433/1997 e 9.966/2000 (protegem os recursos hídricos), 5.197/1967, 7.643/1987 e 9.605/1998 (protegem a fauna e os cetáceos), 6.902/1981 e 9.985/2000 (protegem os parques nacionais e demais unidades de conservação).

O PL não interfere em nenhuma delas!

Ao disciplinar os procedimentos do licenciamento ambiental de uma atividade que poderá causar supressão de vegetação, por exemplo, não é a lei do licenciamento quem dirá se essa supressão será ou não autorizada, e sim as regras previstas na legislação específica, se em área de mata atlântica a Lei 11.428/2006 e se nas demais florestas, a Lei 12.651/2012.

Não é a lei do licenciamento quem dirá se uma indústria pode captar água de um rio e lançar os efluentes tratados de volta, mas sim a Lei 9.433/1997, com suas regras específicas sobre outorga de recursos hídricos.

Não será a lei do licenciamento quem isentará o empreendedor de qualquer responsabilidade por seus atos, pois a legislação de crimes e infrações ambientais continua valendo.

E assim segue com todos os outros recursos naturais e bens ambientais protegidos pela vasta legislação ambiental material, intocada pelo PL.

O que propõe o PL do licenciamento ambiental, então?

  1. estabelece os critérios que as autoridades competentes poderão utilizar para definir quais empreendimentos e atividades estarão sujeitos ao licenciamento ambiental e de que forma este licenciamento ocorrerá;
  2. define prazos de validade das licenças ambientais, bem como os prazos para manifestação da autoridade licenciadora e das demais autoridades envolvidas;
  3. impõe limites às autoridades licenciadoras para a fixação de condicionantes preventivas, minimizadoras e compensatórias dos impactos ambientais negativos decorrentes da instalação e operação do empreendimento ou atividade;
  4. prevê os casos em que uma licença ambiental pode ser suspensa ou cancelada;
  5. diz quais são os estudos ambientais que as autoridades licenciadoras poderão exigir do empreendedor;
  6. disciplina a participação pública no processo;
  7. além de outras questões procedimentais.

Discutido por 17 anos na Câmara, passou por duas Comissões temáticas (inclusive a de meio ambiente) e agora pelo Plenário. Ainda vai ser discutido e votado no Senado, podendo retornar à Câmara (caso haja alteração no texto), e finalmente poderá ir para sanção/veto presidencial.

Centenas de entidades, públicas e privadas, dos mais distintos matizes e interesses, já se manifestaram nessa discussão, uma das mais longas e democráticas das últimas décadas. Entre 2019 e 2020, sob coordenação do deputado Kim Kataguiri, um grupo de trabalho formado por representantes de governos, das entidades dos setores produtivos e de organizações não-governamentais da área ambiental se reuniu dezenas de vezes e elaborou um texto com 95% de consenso, e que serviu de base para o relatório do deputado Neri Geller.

É por isso que ninguém mais leva a sério um punhado de insatisfeitos, que antes aplaudiam 95% do texto, mas agora a chamam de lei do “deslicenciamento”, do “não-licenciamento”, entre outras retóricas sensacionalistas.

O PL vai ser aprovado, vai ser sancionado, vai ser validado pelo Judiciário e vai provar que é bom e muito importante para o país, assim como ocorreu com tantas outras leis ambientais vigentes, criticadas pelos eternos insatisfeitos com a Constituição Federal e com a democracia e que sempre tentam impor à maioria a sua visão excludente de mundo.

Autor: Horácio Gris – Doutor em Direito e Filosofia. Fundador do Instituto Pensando Direito.