Tartarugas monitoradas por satélite percorrem cerca de 800 quilômetros em oito dias entre Noronha e Ceará
24 de fevereiro de 2022Essa é a primeira vez que estudiosos conseguem obter informações sobre migração dos animais. A pesquisa é realizada por equipes do Brasil e dos Estados Unidos.
No terceiro ano de estudo, pesquisadores do Brasil e dos Estados Unidos conseguiram informações inéditas sobre a migração das tartarugas de Fernando de Noronha. Com os transmissores via satélite, colocados em 20 machos, foi possível identificar a rota desses animais. Eles percorreram cerca de 800 quilômetros, em oito dias, até chegar ao Ceará (veja vídeo acima).
“Esse é um grande achado. Nós não tínhamos informações da migração. Nunca um macho marcado em Noronha foi recapturado em outro lugar. Podemos ver que uma tartaruga já percorreu mais de 800 quilômetros, quase 100 quilômetros por dia. No monitoramento, esperamos saber até onde esse animal irá”, declarou o biólogo Armando Barsante, que coordena a pesquisa.
Os estudiosos dizem que os machos usam o litoral do Nordeste para se alimentar. No final do ano, esses animais começam a chegar ao arquipélago em busca das fêmeas para o período reprodutivo.
Ao longo do monitoramento, em três temporadas, 20 transmissores foram instalados: um foi no primeiro ano de trabalho, oito no ano passado e onze equipamentos foram colocados em 2022.
A pesquisa é realizada em parceria pelas universidades americanas Florida State University, University of Massachusets, Oregon State University e a Fundação Projeto Tamar, com financiamento da Fundação de Ciência Nacional dos Estados Unidos National Science Foundation (NSF).
O monitoramento quer saber para onde vão os animais e qual o impacto das mudanças climáticas no sexo da espécie Chelonia mydas, conhecida como tartaruga-verde.
Segundo os estudiosos, as mudanças climáticas são uma ameaça para o equilíbrio do ecossistema. As tartarugas estão no período reprodutivo em Noronha, que começou em novembro e segue até junho, com o nascimento das tartaruguinhas.
Estudiosos fazem inventário dos ninhos — Foto: Michele Roth/Divulgação
Nas tartarugas marinhas, o sexo dos filhotes é determinado pela temperatura da areia onde os ovos ficam incubados. Com o calor maior, cresce o índice de nascimento de fêmeas.
Os estudiosos se revezam na Praia do Leão para marcar os animais e colher material genético. São recolhidas amostras da pele das fêmeas, que desovam à noite, e dos filhotes.
Na temporada 2019/2020 foram realizadas 1002 coletas de material genético. Em 2020/2021, foram 3561 coletas e, nesta temporada 2021/2022, já foram feitas 4563 coletas.
Nesta temporada, até o momento foram identificadas 25 fêmeas e 62 ninhos de tartarugas. O pico de desova deve acontecer em março. Cada ninho tem em média 106 ovos com nascimento de cerca de 90 filhotes.
Todo o material genético coletado vai ser levado para os Estados Unidos para análise. Será possível saber, por exemplo, quem é o pai de cada filhote nascido. Os estudiosos querem identificar o perfil do macho e se existe um animal predominante.
Pesquisadores registram cópulas das tartarugas — Foto: Ana Clara Marinho/Reprodução
Importância do estudo
Os pesquisadores informaram que o trabalho realizado em Fernando de Noronha é importante para todo o mundo.
“Essa pesquisa é de interesse biológico para o planeta. Noronha foi escolhida por ter a facilidade de encontrar os machos, que podem ser capturados e monitorados. Essas informações são relevantes para o mundo inteiro. Queremos saber como as tartarugas podem se adaptar às mudanças climáticas”, disse o coordenador do estudo.
O pesquisador lembrou que as tartarugas existem há milhões de anos. Esses animais dependem do ambiente de praia para se reproduzir. O litoral também é importante para os seres humanos.
“Muitos humanos estão concentrados no litoral e as tartarugas usam essa área também. Com o aquecimento global, regiões de desova podem desaparecer em função de elevação do nível do mar. O estudo pode indicar a mudança de comportamento da espécie, com adaptações e novas áreas de reprodução”, disse Armando.
Pesquisadores fazem mergulhos para observar as tartarugas — Foto: Luis Felipe Bortolon/Divulgação
Tubarões
Alguns estudiosos acreditam que os tubarões-tigres podem aumentar a frequência em Fernando de Noronha no período de reprodução das tartarugas.
Os integrantes da pesquisa que analisa o comportamento das tartarugas realizaram, nos últimos três anos, 172 mergulhos e encontraram seis tigres neste trabalho.
Armando não considera que ocorra um desequilíbrio ecológico em Noronha, com um número desproporcional de tartarugas e tubarões.
“Não acredito em desequilíbrio, a população de tartarugas varia conforme o ciclo natural”, avaliou Armando Barsante.