São Paulo

TRAGÉCIA ANUNCIADA

2 de março de 2023

APENAS A CHUVA NÃO DÁ CONTA DE EXPLICAR TANTOS DESASTRES.

Silvestre Gorgulho

Um ano é em Teresópolis, Petrópolis e Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. No outro, é em Minas Gerais. Antes foi em Santa Catarina. No ano passado, foi na Bahia. E agora é no litoral norte de São Paulo. A verdade é uma só: apenas a chuva não dá conta de explicar tantos desastres e tantas perdas de vida humana e da infraestrutura viária. Segundo os estudiosos do clima e, também, para os especialistas em ocupação urbana de encostas, esses eventos críticos, como as chuvas atípicas que caíram entre a madrugadas de sábado, dia 18, e a noite de domingo, dia 19, em São Sebastião e Bertioga, tem um forte componente de omissão. Do desleixo na gestão. Esses desastres são socialmente ou politicamente construídos por vários fatores. E não basta culpar apenas aqueles que, por falta de opção e por pobreza extrema, buscam plantar suas moradias em locais vulneráveis. Ninguém é pobre porque quer ou mora em condições de falta de segurança porque quer. As pessoas não podem ser culpadas pela própria morte ou pela perda da casa. É tudo muito complexo, mas há que ser encarado de frente pelas autoridades, pela Defesa Civil na busca soluções permanentes e não paliativas.

Após o grave deslizamento, soldados do Exército, Defesa Civil e voluntários buscam por pessoas soterradas no entorno das casas da Vila Sahy, em São Sebastião. (Agência Governo SP)

Barreiras caíram sobre a rodovia, (Agência Brasil – EBC)

Em razão da tragédia das chuvas no litoral norte, região de São Sebastião – SP, o governador Tarcísio de Freitas arregaçou as mangas e se mostrou um gestor solidário. Para o prefeito de São Sebastião, o governador Tarcísio é um especialista em obras e sabe lidar com desafios. Desde o primeiro dia da tragédia, Tarcísio transferiu seu gabinete para São Sebastião, onde ficou ao lado de seus secretários e da primeira-dama Cristiane Freitas vistoriando obras e acompanhando os trabalhos da Defesa Civil. (fotos: PM-SP)

O governador Tarcísio e a primeira-dama, Cristiane Freitas, foram presenças constantes fazendo reuniões e tomando decisões emergenciais. Ambos se estabeleceram numa escola, onde dormiram e coordenaram, com suas equipes, os trabalhos de primeiros socorros.

 

O FATO: MORTOS E DESAPARECIDOS

O Brasil todo conhece a região do litoral sul do Rio de Janeiro e da região norte de São Paulo pelas belas praias, pela beleza da Mata Atlântica e por um turismo intenso. Agora a tragédia se abateu sobre a região de São Sebastião e Bertioga. Na semana antes do Carnaval, a população local e turistas que estavam visitando a região tiveram o impacto das chuvas, enchentes e dos deslizamentos de terra que deixaram muitas vítimas e um rastro de destruição em várias cidades como Ilhabela, Caraguatatuba e Ubatuba. Mas o município que mais sofreu com a tragédia foi São Sebastião, principalmente na costa Sul, entre as praias do Cambury, Barra do Sahy e Juquehy. Segundo as autoridades, foram 65 mortes, além de muitos desabrigados que perderam tudo na tragédia. Segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o volume de chuvas registrados entre os dias 18 e 19 de fevereiro no Litoral Norte foram as maiores já registradas em 24 horas na história do país. Só o pluviômetro de Bertioga registrou 683 milímetros acumulados no período.

BALANÇO FINAL: o corpo da última vítima que estava desaparecida no bairro Vila Sahy foi encontrado na tarde de domingo, dia 26 de fevereiro. Foram 65 mortes. Segundo o boletim estadual, são 1.109 desalojados e 1.172 desabrigados na cidade.

 

O município que mais sofreu com a tragédia foi São Sebastião, principalmente na costa Sul, entre as praias do Cambury, Barra do Sahy e Juquehy. Foram 64 mortes. (foto: Agência Brasil – EBC)

CONSEQUÊNCIAS PARA A REGIÃO

Como sempre, as consequências de desastres como esse vão além dos prejuízos imediatos. O saldo é trágico. Nada se recupera da noite para o dia. Muitas pessoas ficaram desalojadas e perderam todos seus pertences. A região também sofreu graves danos materiais, com casas e comércios destruídos e ruas completamente inundadas. A Rodovia Mogi-Bertioga e vários trechos da Rio-Santos ficaram completamente interditados. Os trechos foram liberados parcialmente e aos poucos.

A população local e a economia da região serão afetadas por muito tempo, já que muitas atividades econômicas, como o turismo, foram suspensas ou estão sendo realizadas de forma limitada.

Na praia Juquehy, também em São Sebastião, vários carros ficaram submersos durante as chuvas. A rodovia cedeu. (foto: Aconteceu IPU)

As autoridades locais e estaduais estão mobilizadas para prestar assistência às vítimas e minimizar os impactos do desastre. Equipes de resgate, incluindo o Exército e a Marinha, Corpo de Bombeiro e Defesa Civil foram mobilizadas para buscar sobreviventes e retirar as pessoas em áreas de risco. A própria Defesa Civil e uma legião de voluntários realizam a distribuição de alimentos, água potável e kits de higiene para as pessoas afetadas.

O ministro Waldez Góes, da Integração e do Desenvolvimento Regional, salienta que o Brasil tem hoje aproximadamente 14 mil pontos de riscos altíssimos de desastre e 4 milhões de pessoas morando nessas áreas. A necessidade de habitação no país é gigantesca. A pandemia, a miséria e o desemprego empurraram, nestes últimos anos, milhares de pessoas para condições ainda mais precárias de moradia.

TRAGÉDIA ANUNCIADA

Para técnicos da Fundação João Pinheiro, de Belo Horizonte, o aumento do desemprego, a baixa renda das famílias e a alta dos aluguéis não deixam outra alternativa para milhões de pessoas, a não ser se aglomerarem em lugares sem infraestrutura e sem interesse do mercado imobiliário formal. Em 2019, a FJP documentou que 24,9 milhões de unidades habitacionais tinham alguma carência de infraestrutura, como coleta de lixo, esgoto, energia elétrica, entre outros.

Segundo o IBGE, nas últimas décadas, o Brasil vem sofrendo um processo de favelização muito crescente. O número de pessoas morando em favelas cresceu 59%, passando de 3,2 milhões de domicílios para 5,1 milhões.

Gigante da Marinha atua como hospital de campanha no litoral norte de SP. Navio-Aeródromo Multipropósito “Atlântico” levou atendimento de saúde e apoio logístico às vítimas das fortes chuvas na região. (foto: Marinha do Brasil)