RIO TIETÊ

MAIS AGUAPÉ QUE ÁGUA

1 de junho de 2023

Aguapé cobre rio Tietê, impede navegação turística e muda festa de 150 anos no interior de SP

Às vésperas do Dia Mundial do Meio Ambiente, um triste registro de falta de sustentabilidade em um dos principais rios brasileiros: o rio Tietê. A grande quantidade de aguapés que cobre trechos do rio Tietê impede os passeios de barcos e prejudica o turismo, em Barra Bonita, no interior de São Paulo. O deslocamento das “ilhas” de plantas aquáticas rio abaixo afeta a navegação pela hidrovia Tietê-Paraná. Pescadores relatam perdas de petrechos e mortes de peixes. Em Anhembi, o ritual da Festa do Divino, tradição de 150 anos, está ameaçado: as canoas usadas pelos festeiros já não conseguem navegar em meio aos aguapés.

O problema dos aguapés se estende às eclusas de Bariri, Ibitinga e à região de Araçatuba, em uma extensão de mais de 350 quilômetros. Foto: Hélio Palmezan/ONG Mãe Natureza

 

Oito navios de cinco empresas operam a navegação turística na região. Juntas, as embarcações têm capacidade para levar três mil passageiros por dia, mas o movimento maior é nos finais de semana. Antes da pandemia de covid-19, ao menos 250 mil turistas faziam os passeios de barco anualmente. Uma das atrações dos passeios é a passagem pela eclusa da Hidrelétrica de Barra Bonita, vencendo um desnível de 26 metros para chegar ao reservatório de Anhembi, formado pelo represamento das águas do Tietê.

O jornalista Carlos Nascimento (ex-Rede Globo, ex-SBT), que se tornou armador fluvial e possui um navio de turismo em Barra Bonita, conta que a eclusa opera de forma muito irregular há meses devido ao excesso de plantas aquáticas. “As embarcações entram na eclusa, sobem, descem e saem à ré, pois não é possível, salvo um dia ou outro, sair a montante. O lago de Barra Bonita ficou bastante comprometido e, no município de Anhembi, a navegação é impraticável”, disse.

O problema dos aguapés se estende às eclusas de Bariri, Ibitinga e à região de Araçatuba, em uma extensão de mais de 350 quilômetros. Nascimento integra um grupo de trabalho criado para discutir o problema das plantas aquáticas. O grupo, que tem também outros armadores, representantes das prefeituras da região, da AES Brasil e pesquisadores de universidades, se reúne mensalmente no Homero Krähenbühl, o barco de Nascimento, para tratar deste assunto.

AÇÃO CIVIL CONTRA A AES BRASIL

A Colônia de Pescadores Z-20, de Barra Bonita, a Federação dos Pescadores do Estado de São Paulo e a Confederação Nacional dos Pescadores e Aquicultores (CNPA) vai pedir a abertura de ação civil contra a AES Brasil devido aos prejuízos causados à pesca pelos aguapés. “Como operadora da barragem e responsável pelo reservatório, a empresa tem o dever de manter a represa livre dos aguapés”, disse o presidente da CNPA e da colônia de Barra Bonita, Edivando Soares.

Segundo ele, em grande parte do rio Tietê as plantas aquáticas tornaram a pesca inviável. “Além da dificuldade para se deslocar com o barco, o pescador arma a rede e, quando volta, ela está totalmente tomada pelos aguapés que são empurrados pelo vento. Ele não consegue recuperar a rede e perde também o peixe, que acaba morrendo preso à malha”, disse. O problema, segundo ele, já afeta 15 mil pescadores do Tietê. “O aguapé chega na barragem e é empurrado rio-abaixo, por isso todo o rio está prejudicado.”

Conforme o diretor de Meio Ambiente da prefeitura de Anhembi, Daniel Zacharias Zago, o excesso de fósforo na água, mais o assoreamento do rio Tietê e seus afluentes, como o Rio do Peixe, favorecem a proliferação das plantas aquáticas. “Os aguapés de deslocam e quando entram na calha do rio vão se acumular na barragem, depois saem pelas comportas e seguem rio-abaixo. Além do turismo, bastante afetado, temos 600 famílias de Anhembi que vivem da pesca.”

Para a AES Brasil, o aguapé faz parte de um conjunto de plantas aquáticas que surgem ao longo dos cursos d’água, incluindo os reservatórios. “Quando há o acúmulo dessas plantas próximas às barragens, a empresa realiza a transposição da vegetação, por meio da abertura das comportas dos reservatórios para permitir que a vegetação siga o fluxo natural do rio.”

Com relação ao controle e fiscalização dos lançamentos de efluentes domésticos e industriais, a Cetesb informou que vem trabalhando a nível estadual, exigindo o atendimento à legislação ambiental. “Nos últimos anos, o índice de tratamento de esgoto no Estado de São Paulo vem aumentando”, disse.