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Atuação ambiental em 2023: um ano marcado por grandes avanços do MPF no Paraná

18 de dezembro de 2023

Proteção de áreas de preservação permanente em mangues e restingas, investigações contra o tráfico de espécie em extinção, análise de impacto de novos empreendimentos em áreas ocupadas por comunidades tradicionais e fiscalização de atos administrativos ganham destaque na atuação da unidade na temática ambiental

 

imagem da copa de uma árvore vista de baixo para cima

Imagem: depositphotos

O ano de 2023 foi marcado por intensa atuação do Ministério Público Federal na esfera ambiental, no estado do Paraná, revelando profundo engajamento do órgão na temática. A proteção dos mangues e restingas ganhou importante destaque, ante a importância destes ecossistemas para a preservação da biodiversidade e auxílio no controle do aquecimento global.

Os manguezais são um grande hotspot de carbono” e, assim, “podem sequestrar quase 1 bilhão de toneladas de carbono por ano, o equivalente a 10% de todo o carbono emitido anualmente no mundo pela espécie humana (10 bilhões de toneladas)”, aponta estudo realizado pelo Departamento de Oceanografia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

A preservação de comunidades tradicionais também foi objeto de atuações, sobretudo no que se refere aos estudos de impacto decorrentes de novos empreendimentos. Além disso, o órgão revelou preocupação e empreendeu esforços no sentido de aprimorar os fluxos referentes à atuação de diferentes órgãos envolvidos na temática do meio ambiente, de modo a criar uma dinâmica de trabalho mais célere.

Diante disso, vale recordar algumas destas importantes atuações e avanços ambientais obtidos ao longo do ano de 2023.

Mangues e restingas – A atuação na região de mangues no estado demandou importante atenção do MPF a partir da identificação de severo impacto ambiental no Complexo Estuarino-Lagunar de Iguape-Cananéia e Paranaguá, situado entre São Paulo e Paraná. A região representa uma das reservas de mangues mais importante do país.

Em Paranaguá, com base em informação do Ibama, constatou-se cerca de 22 fragmentos de manguezais em contato direto com a área urbana. Foram 380 hectares que sofreram com os diversos crimes ambientais decorrentes da ocupação irregular, como o despejo de resíduos sólidos e de esgoto, a construção de aterros, edificações, ruas e asfalto, além da instalação de energia elétrica e água tratada.

Assim, em junho de 2023, o MPF e o MP/PR enviaram recomendação ao prefeito de Paranaguá (PR) para demolição imediata de construções, não ocupadas, localizadas nas regiões de manguezais. Nesse contexto, deu-se início às operações da Ação Integrada de Fiscalização Ambiental (Aifa), formada por integrantes do MPF, MP/PR, Ibama, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Prefeitura de Paranaguá, entre outros órgãos, com o fim de atuar de forma fiscalizatória e periódica na área de mangues de dominialidade da União, em Paranaguá/PR.

As operações no âmbito da Aifa ocorreram de forma periódica, ao longo do segundo semestre do ano, sendo que até a presente data foram 4 intervenções em diferentes localidades de Paranaguá (PR), com demolição de dezenas de construções irregulares.

As restingas também foram alvo da atuação do MPF. Em fevereiro de 2023, no bojo de ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF), a 11ª Vara Federal de Curitiba concedeu liminar para suspender a supressão da vegetação de restinga na orla de Matinhos, autorizada pelo Instituto Água e Terra (IAT) do Paraná. A decisão judicial foi ao encontro do ato administrativo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que já havia suspendido preventivamente o corte da vegetação.

Na atuação, o MPF destaca a importância da vegetação de restinga para se evitar erosões nas praias, que é justamente o que se busca com a execução da obra de engorda da areia. A restinga tem papel fundamental na estabilização dos sedimentos e na manutenção da drenagem natural, sendo a principal responsável pela fixação das dunas e dos manguezais. Além disso, o Bioma Mata Atlântica, do qual a restinga suprimida faz parte, é reconhecido como um dos hotspots de biodiversidade mais ameaçados do mundo.

A investigação evidenciou uma confusão e falta de clareza do Instituto Água e Terra (IAT) sobre a quantificação e classificação das espécies suprimidas. Ora se falou em vegetação exótica, ora em vegetação nativa, mas sem indicação de quais sejam umas e outras.

Agrotóxicos – O MPF atuou também na contenção de agrotóxicos proibidos no Brasil. Em novembro foram condenados dez integrantes de organização criminosa que atuava na importação, comércio e transporte de agrotóxicos clandestinos trazidos do Paraguai para o Brasil. Além das penas de restrição de liberdade aplicadas, a Justiça Federal também determinou o pagamento de mais de R$ 10 milhões a título de indenização por danos morais coletivos. As sentenças foram proferidas em três ações decorrentes das investigações da Operação Terra Envenenada. Pelo menos outras cinco ações contra outros integrantes do grupo ainda aguardam julgamento.

Na sentença, o juiz destacou que o agrotóxico distribuído pela organização criminosa certamente seria utilizado em plantações destinadas à alimentação humana. O magistrado afirmou, ainda, que o manejo e a utilização de tais produtos são regulamentados por legislação específica, considerando os riscos e malefícios pela utilização indevida dos produtos químicos. Assim, foi possível estabelecer ligação entre as condutas dos réus e a grave ofensa delas aos direitos difusos e coletivos, à saúde e ao meio ambiente equilibrado, o que tornou cabível a condenação dos acusados à indenização por dano moral.

Focado na proteção de uma espécie ameaçada de extinção, o papagaio-de-cara-roxa, o MPF atuou conjuntamente com a PF para realizar o monitoramento de áreas de procriação da citada espécie. Para tanto, câmeras de alta precisão foram postas em locais estratégicos. Ao contrário do que ocorreu no ano de 2022, neste ano de 2023, nenhum ninho daquela espécie foi, por ora, violado.

Fiscalização – No campo de fiscalização de atos administrativos, o MPF/PR enviou recomendação para que os ministros da Casa Civil e do Meio Ambiente e Mudança Climática se abstivessem de indicar e aprovar candidatos ao cargo de superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no Paraná que não tenham qualificação na área.

Ainda, em outubro, o órgão manifestou-se contrariamente à indicação de servidor com penalidade disciplinar para Superintendência do Ibama no Paraná, e que não possua qualificação necessária para a vaga da autarquia no Paraná. Para o órgão ministerial, o servidor que havia sido indicado não preencheu critérios técnicos para a função, além de ter sido penalizado em processo disciplinar em sua atuação como diretor de uma escola estadual.

Ainda na esfera de controle de atos administrativos, o MPF defendeu respeito à moralidade administrativa na escolha de superintendente do Patrimônio da União no PR. A indicação de um dos candidatos cotados para o cargo de superintendente, segundo o órgão, contrariou o interesse público e afrontou a Lei 12.813/2013. A norma, que trata do conflito de interesse no exercício de cargos públicos, veda a nomeação de agentes envolvidos em situação que possa comprometer o interesse coletivo ou influenciar de maneira imprópria o desempenho da função.

O campo da melhoria nos trâmites que envolvem fiscalizações e a atuação na esfera ambiental também foi alvo de atuação do MPF no estado. O órgão ministerial e Ibama em Paranaguá (PR) reuniram-se para discutir o aprimoramento de laudos ambientais. A partir destas tratativas os laudos do Ibama passaram a ser produzidos de forma mais detalhada, o que imprimiu maior agilidade nas apurações.

Acerca de aprimoramento dos fluxos e trâmites entre instituições atuantes na esfera do meio ambiente, o Batalhão de Polícia Ambiental do Paraná iniciou, em outubro, remessa de boletins e de termos circunstanciados de ocorrência diretamente ao MPF. O novo fluxo de envio de BOs e TCOs tem o efeito imediato de tornar a persecução penal e cível mais célere, em especial, diante das baixas penas de alguns crimes ambientais, diminuindo, assim, o risco da ocorrência de prescrições.

Impacto ambiental e prevenção – O impacto ambiental do Porto Guará também foi objeto de tutela pelo MPF no ano de 2023. MPF e MP/PR recomendaram ao Ibama a suspensão da audiência pública agendada para o mês de março e retificação do estudo de impacto ambiental do Porto Guará. Isso porque os estudos ignoraram diversas comunidades tradicionais que estão dentro da área de influência do empreendimento, logo, uma audiência pública realizada a partir daquele quadro se daria de forma precária. Se não houver composição extrajudicial, os Ministérios Públicos vão judicializar a questão.

Na mesma linha, de proteção às Comunidades Tradicionais, o MPF e MP/PR recomendaram ao IBAMA a não expedição da Licença de Instalação referente ao Porto Pontal Paraná Importação e Exportação S.A, atual Terminal de Uso Privado Maralto Terminal de Contêineres. A recomendação ainda está no prazo de resposta.

No campo extrajudicial merece destaque o acordo firmado entre MPF e Terras do Paraná para continuidade da construção de empreendimento em São Pedro do Paraná (PR). O Projeto inicial de resort previa instalação de parte do projeto em área de preservação permanente do Rio Paraná. Com o acordo, o empreendedor concordou em apresentar um projeto alternativo que apenas deslocou as estruturas do empreendimento para fora da Área de Preservação Permanente (APP) do Rio Paraná, o que viabilizou a continuidade da construção do empreendimento.

Crimes ambientais – O combate à aquisição de madeira ilegal também foi alvo do MPF. Em maio MPF apresentou denúncia contra a empresa Neo Wood Importação e Exportação e seu administrador, Tierci Tadeu Schmidt, pelo crime de aquisição de madeira ilegal. Na denúncia, Schimidt é acusado, ainda, de falsidade ideológica e uso de documento falso. Com o trâmite processual, operou-se a suspensão condicional do processo à empresa. Porém, em relação a seu administrador, o processo criminal continuou em trâmite perante a 23ª Vara Federal de Curitiba (PR).

O MPF também atuou no episódio de vazamento de nafta em Paranaguá (PR). A Justiça Federal, após pedido do órgão, autorizou à Polícia Federal (PF) acesso a todos os tipos de documentos e informações relacionados ao vazamento de nafta ocorrido em abril, no terminal marítimo Terin no Porto de Paranaguá (PR). O pedido do foi motivado por informações da Polícia Federal sobre negativa de entrega de documentos que estavam na posse de representantes do navio Stolt Sisto, responsável pelo transporte e bombeamento do combustível. O caso corre em segredo de justiça.

Recomendações – Já no que se refere à faixa de infraestrutura, MPF e MPPR recomendam ao Instituto Água e Terra do Paraná que anulasse o licenciamento da obra por ter ignorado diversas comunidades tradicionais que estão dentro da área de influência do empreendimento. A Faixa de Infraestrutura, localizada em Pontal do Paraná, é um conjunto de obras em torno de uma rodovia com cerca de 20 quilômetros. Além da estrada, o projeto prevê a construção de um canal de drenagem, uma linha de transmissão de energia elétrica, um gasoduto e um ramal ferroviário.

Ainda, importante medida foi tomada na localidade da Ilha das Peças (PR), por parte do MPF e MP, visando evitar-se danos ambientais a áreas de preservação permanente e reforçar o controle normativo e fiscalizatório nas regiões litorâneas paranaenses. Assim, foi expedida recomendação à Prefeitura de Guaraqueçaba, no Paraná, ao Instituto Água e Terra (Iat) e à Companhia Paranaense de Energia (Copel), para que adotassem medidas no sentido de impedir autorizações irregulares de instalações de energia elétrica em área de preservação permanente, na Vila das Peças (Ilha das Peças – Guaraqueçaba). A providência visou evitar danos a regiões ambientalmente protegidas, como mangue e restinga.

Por fim, o MPF está atuando judicialmente também para diminuir o desmatamento das Terras Indígenas Mangueirinha e Ilha das Cobras. Um Relatório de Fiscalização do IBAMA, elaborado em novembro deste ano, indica que a Terra Indígena Rio das Cobras está em destaque negativo, na Lista das Terras Indígenas com maiores desmatamentos, sendo a 14ª dentre os 50 maiores desmatamentos em Terra Indígena, única fora da Amazônia legal.