Brasília

HISTÓRIAS DE ZAGALLO

10 de janeiro de 2024

ZAGALLO, LIÇÕES DO VELHO LOBO. Duas histórias de BRASIL contadas por Mário Jorge Lobo Zagallo para alunos de todas as Escolinhas de Futebol de Brasília.

Silvestre Gorgulho

 

Brasil Zagallo – 13 letras. Para Mario Lobo Zagallo o treze era sinônimo de fé e de sorte.

Em junho de 2008, junto com a Embaixada da Suécia, o Governo de Brasília fez uma semana de homenagens aos jogadores da Seleção Brasileira de 1958, que ganharam a primeira Copa do Mundo. Brasília promoveu uma festa inesquecível para 13 (olha o treze, aí) jogadores brasileiros e outros da Seleção vice-campeã, a Suécia.

Vale lembrar que a conquista da primeira Copa do Mundo foi um dos mais importantes marcos da construção da autoestima nacional. Representou um divisor de águas na vida dos brasileiros. Além de ter estimulado conquistas em outros esportes, a construção da nova Capital redescobriu o Brasil do Centro-Oeste.

A vitória dos jogadores campeões de 1958 levou e elevou o nome do Brasil a todos os quadrantes. Apesar do grande reconhecimento público aos Campeões de 58, esses heróis pouco ou nada receberam em termos materiais. Era uma época de pouca valorização profissional dos atletas.

Numa palestra que os jogadores fizeram no Espaço Renato Russo, para todas as escolinhas de futebol de Brasília, Zagallo, Dino Sani, Mazzola, Zito e Pepe contaram muitas histórias para um auditório totalmente lotado de crianças.

Como mestre de cerimônia, abri o encontro e fiz a primeira pergunta, justamente a Zagallo.

– O que vocês ganharam materialmente sendo Campeões da Copa de 1958?

– Olha, recebemos muitas homenagens. A gente ganhava 100 dólares por cada partida. Quando voltamos para o Brasil ganhamos também uma televisão telefunken, um terno Ducal – vinha com duas calças e um paletó – e acho que mais nada…

Foi quando Zito interrompeu Zagallo e trouxe uma polêmica para o encontro:

– Pera aí… Tem uma coisa importante. Nós fomos recebidos pelo então presidente Juscelino Kubitschek no Palácio do Catete e, eu me lembro, ele nos deu um lote. E JK frisou bem, um lote de mansão em Brasília.

Pronto! Começou a discussão. Verdade! Foi mesmo, lembrou Dino Sani, apoiado por Mazzola.

Assim, 50 anos depois, Zito logo reivindicou seu lote de mansão.

– Uai, como a gente pode buscar esse lote? Silvestre, quanto vale hoje um lote de mansão em Brasília?

Minha resposta foi óbvia:

– Pois é, hoje vale muito! Mas nessa época Terra, em Brasília, não valia nada. Brasília era uma utopia. Tanto é verdade que ninguém se interessou. Agora, 50 anos depois, está um pouco difícil.

E o próprio Zagallo mudou de assunto, com uma frase bem característica:

– Os tempos são outros. Estou vendo aqui uns 400 garotos com camisas de vários times. Está ali um grupo de meninos com camisa do Grêmio, do Cruzeiro, do Flamengo, Palmeiras, Fluminense, com camisa do Brasil. Sei que vocês todos estudam. Vou contar uma historinha para vocês.

E Zagallo lembrou um fato que poucos conhecem.

– Queria falar que hoje a camisa as Seleção Brasileira e a Bandeira do Brasil são conhecidas no mundo inteiro. Conhecidas e admiradas. Mas, em 1958, não era assim. Quando chegamos ao hotel, em Estocolmo, o Comitê Organizador da Copa ofereceu um jantar e havia colocado no jardim do hotel uma bandeira de cada país participante. Eu não vi a do Brasil. O Nilton Santos, o Mário Trigo, que falava um pouco de inglês, e eu fomos reclamar com os organizadores da Copa. O Comitê não entendia a reclamação e explicava:

– A bandeira vossa é aquela ali, apontava o sueco.

– Aquela não é nossa!

Deu-se um impasse. Aí perguntei se tinha alguma enciclopédia. Foram buscar uma Delta-Larrouse. Abriu-se o livro no item bandeiras. E estava lá estampada a nossa certeza: a bandeira hasteada era a de Portugal. Reconhecido o erro, o responsável foi contactar a embaixada brasileira para conseguir nossa Bandeira.

Fico imaginando, hoje, mil bandeiras brasileiras nos estádios… Todos nós somos orgulhosos dessa conquista. Tudo isso graças ao esporte, sobretudo graças ao futebol.

E o Velho Lobo, depois de muitos outros casos, respondendo perguntas dos meninos, lembrou outro fato para incentivar as crianças na prática do futebol.

– Vocês gostam de futebol. E muitos aqui podem ser grandes jogadores e até ganharem muito dinheiro. Mas naquela época era diferente. Poucos sabem, mas quando a Seleção Brasileira se preparava para viajar para a Copa na Suécia, a CBD (hoje CBF) não tinha dinheiro para bancar a viagem. O então presidente João Havelange foi ao presidente da República pedir ajuda. JK conseguiu que o Banco do Brasil fizesse um empréstimo para a CBD.

No dia 24 de maio, a Seleção Brasileira viaja. O dinheiro ‘cash’ era só para chegar à Itália, onde foram feitos dois amistosos remunerados: um contra a Fiorentina e outro contra a Inter de Milão. Aí sim, a delegação conseguiu dólares suficientes para chegar à Suécia.

Na Copa de 1958, a Seleção gastou 40 mil dólares e ganhou o título. Velhos e bons tempos! Hoje um jogador de seleção deve ganhar isso por hora.

Mestre Zagallo (treze letras): você fez a vida valer!

 

Foto 1)
Paulo Vítor, ex-goleiro do Fluminense e da Seleção Brasileira, Zito, Mazolla, Pepe, Dino Sani, Zagallo e o Secretário de Culra do DF, Silvestre Gorgulho. Encontro e palestra dos Campeões de 1958
Para as escolinhas de Futebol de Brasília no Espaço Renato Rusdo da 508 Sul.

 

 

Foto 2
Os Campeões de 1958 sendo condecorados com a Medalha de Brasília pelo ex-governador José Roberto Arruda, no Teatro Nacional.