A PAISAGEM CULTURAL DE CUBATÃO 1

CUBATÃO DO VALE DA MORTE A PAISAGEM CULTURAL

1 de fevereiro de 2024

A prova de que desenvolvimento a qualquer preço é estéril.

Silvestre Gorgulho

 

A história e o desenvolvimento de Cubatão, na Baixada Paulista, a 50km de São Paulo, é para ser estudada como exemplo do que fazer e do que não fazer no setor de desenvolvimento e industrialização. É a prova que o desenvolvimento a qualquer preço é estéril. Tudo começou no final da década de 50, quando se deu início a um processo acelerado de industrialização do Brasil. Até então, Cubatão era um paraíso verde, cercada pela Mata Atlântica, rica em recursos naturais, água em abundância e pura e, importante, estrategicamente localizada: perto de São Paulo, maior berço econômico do País, e do Porto de Santos, o maior porto da América Latina. Mas o sonho se transformou em dura realidade. O pior estava por vir.

TRILHA DOS TUPINIQUINS – A Trilha dos Tupiniquins (ou também Caminho de Piaçaguera) é a ligação mais antiga entre o litoral e o planalto paulista. Mesmo antes da fundação de São Vicente por Martim Afonso de Sousa, em 1532, (a primeira cidade brasileira) esse caminho era utilizado pelos índios das tribos no planalto para buscar peixes e outras riquezas marinhas no litoral. Ela adentrava a mata fechada pelo vale do rio Mogi até a região de Paranapiacaba, e daí seguia margeando os rios do atual ABC até encontrar o vale do rio Anhangabaú.

 

A partir da década de 1950, a localização privilegiada – 12km do Porto de Santos e a 50km de São Paulo – fez de Cubatão a “capital petroquímica” do Brasil. Cubatão abrigava mais de 20 fábricas que geraram riqueza, mas também trouxeram muitos problemas ambientais. O excesso de poluição levou a cidade a ficar conhecida como “Vale da Morte” na década de 80.

Na década de 1960, Cubatão tinha 18 grandes indústrias, sendo uma refinaria, uma siderúrgica, sete de fertilizantes e nove de produtos químicos. Era o sonho das lideranças governamentais de Cubatão, do Estado e dos empresários. Ninguém se preocupava com o futuro. A situação era favorável e Cubatão era uma máquina de fazer dinheiro, de riqueza, de arrecadação e de ganância. Indústrias, exportações e produção geravam bilhões de cruzeiros ao ano. Cubatão passou a ser uma das regiões mais arrecadadoras do Brasil. Só de impostos rendia cerca de 76 bilhões de cruzeiros. O município representava 2% de toda a exportação do país. Mas tudo isso tinha um preço a pagar, porque a construção das indústrias aconteceu de forma indevida e invasiva ao meio ambiente.

Em 15 anos, cerca de 60 Km² de Mata Atlântica havia sofrido a degradação, formando uma clareira que podia ser vista até por satélite. Em 1970, a emissão de componentes químicos tóxicos como monóxido de carbono, benzeno, óxidos de enxofre e nitrogênio e hidrocarbonetos liberados em Cubatão ultrapassava mil toneladas por dia. A ocorrência de chuva ácida também era frequente por lá. No início da década de 80, Cubatão foi considerada pela ONU como a cidade mais poluída do mundo. Incrustada na Serra do Mar, centro industrial e siderúrgico, próxima ao maior porto do País, o Porto de Santos, Cubatão enfrentou o desafio. Com a criação da Cetesb e a pressão da sociedade foi possível o controle da poluição e a recuperação ambiental.

Em 18 de setembro de 2017, em ação proposta pelo Ministério Público de São Paulo e pela OIKOS – União dos Defensores da Terra, a Justiça condenou 24 empresas integrantes do Polo Industrial de Cubatão pelos danos ambientais causados ao meio ambiente.

 

Além de ter acelerado a destruição do ecossistema florestal, a degeneração da cobertura vegetal causou o assoreamento dos rios Mogi, Perequê e das Pedras, bem como de outros cursos de água, entre outras consequências graves para o meio ambiente da região.

Exemplo de desenvolvimento a qualquer custo. Na década de 1970, o Polo industrial não tinha nada de sustentabilidade e tinha muito de exploração longe das regras ambientais. (Foto: Alfredo Rizzutti/Estadão-1/4/1982)

 

Em 1986, a ONG Oikos – União dos Defensores da Terra entrou com uma ação contra 24 indústrias do polo de Cubatão pelos danos ambientais causados ao meio ambiente em decorrência da atividade exercida sem os devidos cuidados. Essa ação foi importante para o movimento ambientalista que começava a se firmar no Brasil, ainda antes da Constituição de 1988. O resultado favorável da ação da OIKOS saiu em 2017, 31 anos depois. O Cide (Centro de Integração e Desenvolvimento Empresarial da Baixada Santista), que fala em nome das 24 empresas, afirmou que vai “alinhar os respectivos recursos visando a esclarecer os pontos levantados na decisão”. Informou também que, “ao longo das últimas décadas, as empresas promoveram diversos investimentos em medidas de cunho ambiental que hoje transformaram a Serra do Mar em exemplo de programa de manejo e recuperação ambiental no Brasil e no mundo”.

 

 

O PLANO DE CONTROLE AMBIENTAL

 

No início da década de 80, a emissão de material particulado em Cubatão chegava a 363 mil toneladas/ano e atualmente foi reduzida a mais de 90%, segundo a Cetesb. Dentre esses, os monóxidos de enxofre e a amônia, considerados grandes vilões por causarem a chuva ácida, que matava a vegetação da Serra do Mar, foram reduzidos em 72,17% e 99,43% em 2008.  Todos os dados sobre o plano de recuperação e de controle ambiental é disponibilizado pela Cetesb, assim como pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado de S. Paulo e a prefeitura de Cubatão.

Do planejamento constavam medições constantes das emissões de poluentes no ar e do controle da despoluição dos rios, causados pelo despejo de substâncias tóxicas indevidas em grande escala, gerenciamento por conta do estado e investimento em maquinário moderno por conta das indústrias. Estabeleceu-se metas rígidas a serem seguidas. De outro lado, houve um planejamento de recuperação da Mata Atlântica com o replantio da vegetação nativa, proteção das nascentes e defesa da flora e fauna da região. Nos anos de 1990 a volta do guará-vermelho, pássaro típico da região, foi considerado pelo governo municipal o marco de que a qualidade de vida voltava à cidade.

Emancipada em 1º de janeiro de 1949, Cubatão acaba de celebrar seu 75º aniversário. Localizada no sopé da Serra do Mar, a história de Cubatão começa muito antes como Trilha dos Tupiniquins, que dava acesso ao Planalto Paulista. Hoje a cidade tem como desafio se desenvolver mantendo o equilíbrio socioambiental. (foto: Nair Bueno/Diário Litoral)

 

OLHAR PARA A FRENTE

O Complexo Industrial de Cubatão conseguiu se manter firme, sendo o mais importante do país em diversidade de produção e que gera milhões de reais todos os anos. Conciliar o sucesso industrial com a cidade e sua população é o desafio da atualidade para que o equilíbrio socioambiental se complete.