Acervo indígena com mais de 500 peças retido na França chega ao Brasil depois de 20 anos
13 de julho de 2024Vinte anos depois de permanecerem retidos no Museu de História Natural de Lille (MHN), na França, 585 dos 607 artefatos indígenas chegaram ao Brasil nesta quarta-feira (10). As demais peças que faltam não puderam compor o acervo transportado por falta de documentação necessária para a retirada. Alguns artefatos são considerados raros por terem sido… Ver artigo
Vinte anos depois de permanecerem retidos no Museu de História Natural de Lille (MHN), na França, 585 dos 607 artefatos indígenas chegaram ao Brasil nesta quarta-feira (10). As demais peças que faltam não puderam compor o acervo transportado por falta de documentação necessária para a retirada. Alguns artefatos são considerados raros por terem sido confeccionados com elementos de flora e fauna em extinção. O conjunto de objetos provém de mais de 40 povos diferentes.
A repatriação do acervo é fruto de complexa negociação entre o museu francês e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Ministério das Relações Exteriores (MRE) e Ministério Público Federal (MPF), dada a importância da coleção e a proteção constitucional do patrimônio cultural brasileiro.
Os materiais são protegidos pela Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (Cites), estabelecida no Brasil por meio do Decreto nº 3.607, de 21 de setembro de 2000.
“É um momento de reflexão sobre a importância de preservar e valorizar o nosso patrimônio cultural. Esse processo de repatriação não teria sido possível sem a colaboração intensa das instituições envolvidas. Retornar essa arte indígena é retornar um pedaço da nossa história”, enalteceu a presidenta da Funai, Joenia Wapichana, ao anunciar a repatriação das peças durante a inauguração do Centro Audiovisual (CAud), nesta quinta-feira (11), em Goiânia (GO). Joenia também anunciou que tão logo seja possível, a Funai e o Museu do Índio (MI) irão promover exposições das peças repatriadas.
Vistoria do acervo
O acervo deve passar por minuciosa vistoria antes de ser liberado pelas autoridades aduaneiras. Após a conferência e autorização, a carga será transportada ao Museu do Índio, órgão científico-cultural vinculado à Funai, localizado no Rio de Janeiro.
No MI, as peças serão desembaladas para a conferência de seu estado em comparação com os relatórios emitidos quando os artefatos saíram do MHN de Lille. “Nossa recomendação é que o acervo passe por um período de quarentena antes de ser exibido, para evitar possíveis contaminações, como é de praxe com acervos museológicos”, sugere a diretora do MI, Fernanda Kaingang.
As peças foram enviadas ao exterior em 2004 sem obedecer os trâmites legais que envolvem a saída do Brasil desse tipo de material.
Peças raras
O acervo repatriado é composto de itens etnográficos que representam a variedade de manifestações da cultura material dos povos indígenas que vivem no Brasil. Entre eles, encontram-se diversos adornos Kayapó e Enawenê-Nawê, considerados raros ou inexistentes nas coleções brasileiras. E também objetos Araweté como chocalhos, arcos e raros brincos emplumados produzidos a partir das penas do anambé azul e da arara vermelha.
Reparação
Com o acervo indígena de volta ao país de origem, a expectativa é que se negocie com a França medidas de reparação aos povos envolvidos, levando-se em consideração o complexo processo para garantir o retorno das peças, bem como o tempo que o acervo ficou retido e os danos sofridos.
Para o coordenador técnico-científico do Museu do Índio, Seije Nomura, que tem acompanhado o processo de repatriação das peças, é preciso encontrar medidas que garantam que os empréstimos de acervos sejam mais vantajosos para as comunidades indígenas, com repartição de benefícios para os povos de onde advém as expressões culturais em circulação. E, ainda, medidas que garantam o correto acompanhamento e retorno de acervos emprestados a museus estrangeiros.
“Deve-se estimular, como já tem ocorrido, que eventuais empréstimos também contemplem a previsão de os próprios artistas e mestres de saberes apresentarem e falarem sobre seus acervos – o que promove o protagonismo dos povos indígenas”, ressaltou Seije Nomura.
A partir do recebimento dos itens no Museu do Índio no Rio de Janeiro, a Coordenação de Patrimônio Cultural fará a gestão do acondicionamento das peças para poder encerrar esta etapa do processo de repatriação. “Contudo, não se considera o procedimento completo sem que haja busca das reparações e, ainda, de formas de acesso pelos povos indígenas e pelo público em geral ao acervo”, considerou o coordenador técnico-científico do museu.
Assessoria de Comunicação/Funai