Embrapa identifica primeiro caso de “vassoura de bruxa” da mandioca no Brasil
16 de agosto de 2024A doença foi constatada nos plantios de mandioca das terras indígenas de Oiapoque, município do estado do Amapá, localizado na fronteira do Brasil com a Guiana Francesa.
Foto: Adilson Lima
A doença é causada por um fungo de ocorrência inédita no País.
A partir de análises biológicas e moleculares, a Embrapa Amapá e a Embrapa Mandioca e Fruticultura confirmaram ao Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) o primeiro relato da presença, no Brasil, do fungo Ceratobasidium theobromae, também conhecido como Rhizoctonia theobromae, causador da doença “vassoura de bruxa” da mandioca. O patógeno foi confirmado por laudo do MAPA, por meio de análise de identificação da espécie realizada por equipe deste Ministério.
A doença foi constatada nos plantios de mandioca das terras indígenas de Oiapoque, município do estado do Amapá, localizado na fronteira do Brasil com a Guiana Francesa. A presença de Ceratobasidium theobromae representa risco de significativa redução na produtividade das plantas de mandioca afetadas. Até o momento, este fungo não foi detectado em outros hospedeiros no Brasil.
A “vassoura de bruxa” tem este nome porque deixa os ramos das plantas secos e deformados incluindo nanismo e proliferação de brotos fracos e finos nos caules, parecidos com uma vassoura velha. Com a evolução da doença é comum a ocorrência de clorose, murcha e seca das folhas, morte apical e morte descendente das plantas.
A dispersão de Ceratobasidium theobromae pode ocorrer por meio de material vegetal infectado, ferramentas de corte, além de possível movimentação de solo e água. “A movimentação de plantas e produtos agrícolas entre regiões pode facilitar a dispersão do patógeno, aumentando o risco de infecção em novas áreas”, alerta a Nota Técnica da Embrapa (aqui na íntegra).
Pesquisadores do Centro Francês de Pesquisa Agrícola para o Desenvolvimento Internacional (CIRAD/França), em parceria com o Centro Internacional de Agricultura Tropical (CIAT/Colômbia), coletaram e isolaram Ceratobasidium theobromae em áreas afetadas com sinais similares na Guiana Francesa, próximas à fronteira com o Brasil e o Suriname.
A Embrapa destaca também que a detecção de Ceratobasidium theobromae no Brasil requer cooperação imediata entre agentes de assistência técnica, órgãos de defesa vegetal estaduais, pesquisadores, agricultores e autoridades governamentais, como uma prática fundamental para implementar medidas efetivas de contenção, manejo e controle, a fim de garantir a segurança e sustentabilidade da produção agrícola. A descoberta da Embrapa pode contribuir com o avanço científico das pesquisas relacionadas para o melhoramento genético da mandioca e recomendação de medidas para o controle da doença.
Recomendações para diminuir o impactoPara diminuir os impactos da nova doença, a Embrapa recomenda estratégias que vão desde o protocolo de detecção precoce do patógeno, uso de manivas de comprovada sanidade, boas práticas agrícolas, entre outras, envolvendo os diversos agentes que atuam nas respectivas recomendações: 1. Monitoramento e Vigilância: Intensificação do monitoramento das áreas de cultivo para identificação precoce de sintomas. 1.1. Estabelecer protocolo de detecção precoce do patógeno via PCR e/ou via sequenciamento por HTS em suporte às ações de monitoramento e vigilância 1.2. Acreditar laboratórios para a realização do diagnóstico e indexação para patógenos de importância para a cultura 2. Quarentena: Implementação de medidas de quarentena para restringir a movimentação de material vegetal de áreas afetadas. 3. Manivas sadias: Uso de manivas com comprovada sanidade, e produzidas em regiões sem a doença, ou em condições que não permitam o desenvolvimento do patógeno (ex. câmaras térmicas, viveiros e estufas) 4. Tratamento Químico: Uso de fungicidas específicos para controlar a dispersão do patógeno, conforme regulamentações locais. 5. Práticas Culturais: Remoção e eliminação por queima de plantas doentes como forma de reduzir o inóculo nas áreas afetadas e diminuir a incidência de novas plantas infectadas. 6. Assepsia / sanitização de ferramentas utilizadas para a destruição das plantas com sinais da doença. Lavagem com água e detergente e em seguida a sanitização com solução de hipoclorito de sódio a 1,25%. 7. Realizar o ensacamento e rápida lavagem de roupas, calçados e chapéus e ou bonés utilizados nas visitas em áreas afetadas pela doença, de forma a evitar a disseminação de esporos para outras regiões do país. 8. Elaborar publicações, vídeos e cartazes para o esclarecimento do público em geral sobre os sinais e modos de transmissão da doença. |
Histórico de coleta do material infectado
Em março de 2023, uma equipe da Embrapa Amapá participou da 29ª Assembleia de Avaliação e Planejamento dos Povos e Organizações Indígenas do Município de Oiapoque (APIO), evento realizado pelo Conselho dos Caciques dos Povos Indígenas do Oiapoque (CCPIO). A instituição de pesquisa foi demandada para avaliar e realizar ações, dentro das suas atribuições, visando amenizar a ocorrência de doenças que atingem os plantios de mandioca. Na semana seguinte, uma equipe constatou in loco os sinais compatíveis com a doença ‘vassoura de bruxa’ da mandioca nas aldeias indígenas Ahumãm, Anawerá, Tuluhi e Tukay.
Posteriormente, os mesmos sinais foram detectados nas aldeias Kuahí, Ywawká, Karibuen, Kuai Kuai, Ariramba, Galibi, Lençol, Manga, Zacarias e Japiim. De acordo com a Nota Técnica da Embrapa Amapá, por ocasião da detecção dos primeiros sinais da doença, hastes de mandioca infectadas foram transportadas para o laboratório de Proteção de Plantas da Embrapa Amapá, visando o isolamento do provável agente etiológico da doença em condições de laboratório.
Análise molecular do fungo
Com a evolução dos sinais de doenças nas roças dos indígenas do Oiapoque, novas amostras de plantas infectadas foram analisadas no Laboratório de Fitopatologia da Embrapa Mandioca e Fruticultura (Bahia), visando realizar a diagnose molecular do agente causal deste novo surto epidêmico no estado do Amapá.
As amostras foram então liofilizadas e preservadas em -80 °C para as análises de sequenciamento profundo (Deep sequencing) em sequenciadores de alta performance (High-Throughput Sequencing) em plataformas Illumina e Nanopore, em parceria com a Coleção Alemã de Microrganismos e Culturas Celulares (Deutsche Sammlung von Mikroorganismen und Zellkulturen – DSMZ), na Alemanha.
Em seguida foi feito o sequenciamento de amostras conjuntas (pools) com base nos diferentes tecidos coletados (folhas, pecíolos e hastes), e a comparação entre os patógenos com maior concordância entre estes, presença de patógenos endêmicos e de importância para a cultura, bem como de potenciais patógenos não relatados no Brasil.
Um conjunto grande de patógenos e organismos endofíticos foi detectado pela técnica empregada e que estão associados à cultura, mas nunca relatados associados aos sinais observados in loco, exceto para o Ceratobasidium theobromae, um fungo nunca antes relatado no continente Americano.
Dulcivânia Freitas (DRT-PB 1.063/96)
Embrapa Amapá
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