JEAN DE LÉRY FAZ A PRIMEIRA VISITA AOS TUPINAMBÁS (Parte 12)
1 de fevereiro de 2025O relato de Jean de Léry (1536-1613 sobre o início da História do Brasil é impressionante. Léry é aquele que entrou de gaiato no navio, ao acreditar na balela do poderoso Nicolas Durand de Villegaignon. Léry embarcou em um dos navios franceses que vieram para o Rio de Janeiro em 1553. O relato que… Ver artigo
O relato de Jean de Léry (1536-1613 sobre o início da História do Brasil é impressionante. Léry é aquele que entrou de gaiato no navio, ao acreditar na balela do poderoso Nicolas Durand de Villegaignon. Léry embarcou em um dos navios franceses que vieram para o Rio de Janeiro em 1553. O relato que o artesão e futuro pastor calvinista deixou aos brasileiros é muito precioso. Jean de Léry conta sobre sua visita aos índios pela primeira vez, três semanas depois de sua chegada à ilha de Villegaignon, no Rio de Janeiro.
VISITA A ALDEIAS NO CONTINENTE
Pela primeira vez os indígenas conhecem alguém com nome de gente: “Os nossos tupinambás recebem com muita cordialidade os estrangeiros que os vão visitar; como estes, porém nãos entendem a língua, ficam a princípio meio esquerdos entre eles. Visitei esses selvagens pela primeira vez três semanas depois de nossa chegada à ilha de Villegaignon e fui em companhia de um intérprete a três ou quatro aldeias do continente.
Visitamos em primeiro lugar a aldeia de Jaburaci, chamada pelos franceses de Pépin por causa de um navio que ali carregara outrora e cujo mestre tinha esse nome. Essa aldeia distava apenas duas léguas de nossa fortaleza e quando ali entrei vi-me logo rodeado por inúmeros selvagens que me perguntavam: ‘Marapê-dererê, marapê-dererê’, isto é, ‘como te chamas?’.
Mas eu entendia isso como entendo grego e fiquei na mesma. Um deles tomou então o meu chapéu e o pôs na cabeça; outro pegou na minha espada e cinto e os cingiu; outro tirou-me o casão e o vestiu; e todos me aturdiam com seus gritos enquanto corriam pela aldeia com os meus trajes e no meio dessa confusão eu já nem sabia onde me encontrava. Meu enleio provinha entretanto de ignorar que assim fazem com todos os estrangeiros , o que pude verificar posteriormente, sobretudo com aqueles a que nunca viram. Mas depois de se divertirem bastante com os objetos alheios eles os restituem a seus donos.
OS ÍNDIOS QUERIAM SABER MEU NOME
O intérprete me avisara de que os selvagens iriam principalmente querer saber o meu nome. Dizer-lhes que me chamava Pedro, Guilherme ou João parecia-me inútil, pois não conseguiriam reter o nome na memória nem o pronunciar corretamente. E, assim, de fato ocorreu quando trocaram o ‘Jean’ por ‘Nian’. Fazia-se necessário, portanto, dar um nome que eles conhecessem e como ‘Léry’ em sua língua quer dizer ostra, disse chamar-me ‘Léry-açu’, isto é, ‘Ostra Grande’.
Mostraram-se os selvagens muito satisfeitos, rindo-se entre exclamações e dizendo: ‘Em verdade eis um bonito nome e ainda não vimos nenhum ‘mair’ com nome igual’. Posso garantir que nunca Circe metamorfoseou em homem tão linda ostra e que Ulisses não discreteou com ela mais sutilmente do que eu fiz com os selvagens desde então. E note-se que os selvagens têm tão boa memória que nunca mais esquecem o nome dado nem que fiquem cem anos sem rever a pessoa”.
PRÓXIMA EDIÇÃO 372 – Parte 13
Jéan de Lery conta uma experiência estarrecedora. Diz ele: “Ao chegarmos (o intérprete e eu) na aldeia dos Tupinambás, pouco antes do pôr do sol, encontramos os selvagens dançando e bebendo cauim em homenagem a um prisioneiro morto seis horas antes e cujos restos ainda pudemos ver no moquém. Naturalmente fiquei estarrecido diante de semelhante tragédia”. Explica Léry que o intérprete foi tomar cauim com os índios e o deixou sem instruções. “Com a bulha que faziam os selvagens dançando e assobiando e festejando a matança do prisioneiro não me foi possível dormir; eis que de repente um dos convivas traz-me na mão um pé assado e moqueado da vítima e se aproxima de mim perguntando se desejava comer…”