DIA DA ÁRVORE E PRIMAVERA 2

ÁRVORES EM POESIA

1 de setembro de 2025

QUEM FOI AUGUSTO DOS ANJOS

Silvestre Gorgulho

Em setembro se comemora o Dia da Árvore e o início da Primavera. Então, nada melhor que do lembrar um belo soneto de Augusto dos Anjos.

Silvestre Gorgulho

Paraibano de nascimento, Augusto dos Anjos (Sapé-PB 20/abril/1884 – Leopoldina-MG 12/novembro/1914) tinha um movimento próprio dentro da literatura brasileira. Por isso mesmo, muito original. Deixou apenas um livro com sua obra que não se encaixa em nenhuma escola literária, apesar de que sua produção poética tenha características no espectro do naturalismo e do simbolismo.

Filho de antigos senhores de engenho, o poeta vivenciou, desde a infância, a lenta decadência de sua família. O pai, bacharel em Direito, ensinou-lhe as primeiras letras até seu ingresso no Liceu Paraibano para cursar o ensino secundário. As circunstâncias da vida levaram Augusto dos Anjos a se transferir para o Rio de Janeiro, onde passou a lecionar Geografia depois de cerca de um ano desempregado. Em 1912, com a ajuda de seu irmão Odilon, publica único livro: EU – com 56 poemas. Nunca recebeu apoio dos colegas da literatura. Pelo contrário. Foi muito criticado.

AUGUSTO DOS ANJOS – Sua obra e o legado são preservados em um memorial instalado em Sapé-PB e em Leopoldina, no Museu Espaço dos Anjos.

Na Paraíba, o Memorial a Augusto dos Anjos preserva obra e legado do poeta. (Foto: Beatriz Freire)

Dois anos depois de publicar seu livro, em junho de 1914, Augusto dos Anjos mudou-se para Leopoldina, (MG), para assumir o cargo de diretor de um grupo escolar na cidade. No mesmo ano, em 12 de novembro, aos 30 anos, uma pneumonia dupla interrompeu a trajetória do poeta. A casa em que residiu durante seus últimos meses de vida, Rua Barão de Cotegipe, 386 – Leopoldina, é hoje o Museu Espaço dos Anjos.

Outra homenagem ao poeta: a Academia Paraibana de Letras está estabelecida na antiga residência de Augusto dos Anjos, em João Pessoa.

 

A ÁRVORE DA SERRA

Augusto dos Anjos

 – As árvores, meu filho, não têm alma!

E esta árvore me serve de empecilho…

É preciso cortá-la, pois, meu filho,

Para que eu tenha uma velhice calma!

– Meu pai, por que sua ira não se acalma?!

Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!

Deus pôs almas nos cedros…  no junquilho…

Esta árvore, meu pai, possui minh’alma!…

– Disse – e ajoelhou-se, numa rogativa:

“Não mate a árvore, pai, para que eu viva!”

E quando a árvore, olhando a pátria serra,

Caiu aos golpes do machado bronco,

O moço triste se abraçou com o tronco

E nunca mais se levantou da terra!

O DIA EM QUE A NATUREZA VENCEU

 

Silvestre Gorgulho

O fotógrafo LEANDRO BARCELLOS dá uma lição profissional e emocionante. Fotografa um pé de ipê que foi arrancado da floresta para servir de poste. Este exemplo de Porto Velho, em Rondônia, é muito forte. E pontual. O tronco do ipê amarelo cortado e transformado em poste recebe todo tipo de fiação. Fios de energia, de telefonia, de tevê a cabo e até a iluminação pública. A foto mostra bem como o emaranhado de fios, pregos, ganchos e arames sufocam o ipê.

 

Ao abraço de urso, o ipê dá uma resposta pacífica aos agressores. Às marteladas, facões e serrotes, responde com amor. Ao desrespeito e abandono, oferece uma vez mais sua sombra e se veste de flores. Ao assassinato de seus galhos e folhas, responde com a vida.

Apesar do constante confronto entre o ser humano e a natureza pela utilização dos recursos naturais, a natureza responde sempre com magnanimidade e abundância. As provas de que a natureza é magnânima e exuberante estão aí aos montes: para despoluir um rio, basta deixar de poluí-lo. Para recuperar uma área degradada, basta deixá-la livre das agressões físicas e químicas. E para reconstituir uma floresta, basta recuar com as motosserras e proteger a área por alguns anos. O poste-ipê ressuscita para anunciar a Primavera.

O PÉ DE IPÊ QUE FLORIU

Foto: Leandro Barcellos

O MILAGRE DO IPÊ

 Silvestre Gorgulho 

 O Primeiro Ato é mais que conhecido:

– Esta árvore é minha! Vocifera o bronco.

Vai me trazer o conforto merecido.

Este pé de ipê é de excelente porte.

Tira-lhe os galhos… raspa-lhe o tronco,

Pois que está condenado à morte!

 

 Vem, a seguir, o Segundo Ato:

– Tudo tem que estar pronto ao fim do dia.

Não há espera. Árvore é no mato!

Prendem-lhe fios, arames e pregos

Para que a modernidade em energia

Chegue a todo bairro em imediato!

 

 O Terceiro Ato é mais que previsível.

– Morreu como um crucificado!

É forte? Madeira de lei? É invencível?

Que nada! Estarei no meu sofá sentado

E este pé de ipê me dará alívio

Ao trazer luz, tevê e ar-condicionado.

 

Como fez o Cristo no Calvário.

 O Ipê – no Quarto Ato – foi divino:

Abriu em belíssimo cenário

Para ressurgir florido à espera

De ofertar flores ao assassino.

Exuberante! Lindo! Uma quimera!

Respondeu com paz, o solitário,

E saudou com vida a Primavera!