Flávio Terra Barth

18 de fevereiro de 2004

O adeus a um grande técnico





 










     O ambiente técnico-científico dos recursos hídricos perdeu um de seus mais expressivos valores intelectuais, o engenheiro Flávio Barth, falecido em São Paulo, em 30 de maio passado.


Terra Barth colaborou praticamente em todos os trabalhos que levaram à construção do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, tendo contribuído, também, em diversos estados do Brasil. Nos últimos tempos vinha prestando consultoria à Secretaria de Recursos Hídricos do MMA e ao trabalho de implantação da Agência Nacional de Águas – ANA.


Costuma-se dizer que é raro ler-se um trabalho sobre recursos hídricos, no Brasil, que não contenha pelo menos uma citação a textos produzidos por Barth. Uma perda verdadeiramente irreparável.








Homenagem a Terra Barth

17 de fevereiro de 2004

        Conheci Flávio Terra Barth em Salvador. Corria o ano de 1991, quando o secretário Estadual de Recursos Hídricos, César Borges, hoje governador da Bahia, e meu superior imediato à época, me estimulou a realizar um seminário para discutirmos outorga. A Bahia já praticava a outorga desde 1987, em razão dos graves conflitos na… Ver artigo

 









      Conheci Flávio Terra Barth em Salvador. Corria o ano de 1991, quando o secretário Estadual de Recursos Hídricos, César Borges, hoje governador da Bahia, e meu superior imediato à época, me estimulou a realizar um seminário para discutirmos outorga. A Bahia já praticava a outorga desde 1987, em razão dos graves conflitos na bacia do rio Salitre, afluente intermitente do São Francisco, pela margem direita.


Terra Barth foi a primeira pessoa a quem convidei para o seminário. Sabia de sua competência e conhecimento no campo dos recursos hídricos. Sua presença era uma certeza de sucesso e produtividade. Já na conferência inaugural, Barth foi capaz de demonstrar, com argumentos certeiros e exemplos bem claros – lembrando sempre a realidade de São Paulo – como a Bahia estava no caminho certo. E mais ainda: o que deveria ter continuidade, o que deveria corrigir e, ainda, o que ainda não se fazia na Bahia e que não podia deixar de ser feito. Em breves flashes ele ministrou uma grande aula, que restou inesquecível em nossa memória e para todos os que lotaram o auditório da sede da Delegacia Regional do DNOCS. Essa foi a primeira de uma série interminável de lições que aprendi com Barth.
Daquele momento, até o final de abril deste ano, quando deixou o nosso convívio, Barth foi o mais procurado, o mais disputado e mesmo o mais cobiçado dos consultores em gestão de recursos hídricos em todo o Brasil. A Bahia, a Secretaria do Meio Ambiente do MMA, a própria Agência Nacional de Águase vários outros estados foram, por Barth, diligentemente acompanhados. 


De tantas idéias das quais foi o pai, por nenhuma Tera Barth reivindicou o mérito da autoria


Mas o que verdadeiramente era impressionante em Barth era a sua disponibilidade para todos. Sempre com o mesmo espírito de colaboração, com a mesma calma, e uma atenção hindu para com seus interlocutores, em todos os momentos. De tantas idéias das quais foi o pai, por nenhuma reivindicou o mérito da autoria. Nisso, aliás, beirou a unanimidade. Mas, não apenas nisso! Falemos de poder de síntese. Nunca pôde alguém, com tamanha facilidade, levar a uma planilha, fluxograma, organograma ou qualquer outro formato sintético, idéias complexas que por suas mãos tornavam-se simples para o entendimento de todos.


Na forma, quase nunca rebuscava, a não ser quando necessário. Mas, no conteúdo, suas idéias estavam sempre em perfeita sintonia com o estado da arte, quando não era o próprio estado da arte dando um passo à frente, expandindo ágil e inteligentemente a fronteira do conhecimento técnico científico.


Humanista, Flávio sempre esteve preocupado com a formação de quadros para a gestão dos recursos hídricos no Brasil. Era daqueles que praticava, de modo aberto, o princípio segundo o qual, ao trocar com um colega uma idéia por outra, cada um sairia do diálogo levando duas idéias em lugar da única com que chegou para o debate.


Duas idéias assim viravam quatro. Via nisso a riqueza e mesmo a própria essência da vida profissional. E, com isso, amealhou um colossal conjunto de conhecimento que dividiu com todos, enriquecendo decisivamente a engenharia de recursos hídricos de nosso país e repercutindo significativamente no plano internacional. Prova disso é que foi o mais citado em livros, teses, monografias, artigos e tantas outras manifestações de profissionais do setor, brasileiros e estrangeiros.


Foi-se Flávio, com suas idéias. Idéias que, graças à sua postura, também ficaram entre nós. Mas não mais teremos Flávio para nos acompanhar no enfrentamento dos desafios do futuro. Tê-lo-emos vivo, entretanto, por meio do exemplo que deixou, da sua filosofia de vida, da sua conduta, como profissional, como chefe de família e como amigo. Imitemo-las.


*Raymundo Garrido é Secretário de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente.