PDBG - Primeira reportagem de uma série

Baía de Guanabara: agonia de uma poluição sem fim

10 de fevereiro de 2004

Calcula-se que até agora foram gastos cerca de R$ 1,5 bilhão. E, incrível, a poluição na baía continua firme e forte, enquanto a governadora Rosinha Garotinho negocia com o BID uma segunda etapa de US$ 402 milhões Após oito anos de uma operação milionária para recuperação do seu ecossistema, a Baía de Guanabara continua agonizando… Ver artigo

Calcula-se que até agora foram gastos cerca de R$ 1,5 bilhão. E, incrível, a poluição na baía continua firme e forte,
enquanto a governadora Rosinha Garotinho negocia com o BID uma segunda etapa de US$ 402 milhões



Após oito anos de uma operação milionária para recuperação do seu ecossistema, a Baía de Guanabara continua agonizando em meio à poluição. A primeira etapa do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG) ficou aquém das expectativas. Preocupadas com as denúncias, autoridades públicas do Rio resolveram investigar o que deu errado. A Assembléia Legislativa do Estado (Alerj) instaurou uma CPI – Comissão de Inquérito Parlamentar – para apurar a má gestão do dinheiro público. O programa, por sua vez, está longe de ser concluído. O prazo contratual seria julho de 2003. O atual governo adiou o término da primeira fase pela quinta vez. O novo prazo passou para primeiro semestre de 2004. Segundo a Secretaria do Meio Ambiente, as obras do PDBG continuam paralisadas, embora o órgão tenha “emitido o processo administrativo autorizando a excepcionalização do PDBG do Decreto estadual n.º 32.623, que trata da suspensão temporária dos pagamentos, visando a retomada imediata das obras do programa”.


A bela Baía
A Baía de Guanabara é uma extensa baía costeira com um total de cerca de 390 km2 dos quais 50 km2 são ocupados por ilhas. Mede 28 km de leste para oeste e 30 km de norte para sul. A entrada tem apenas 1,6 km de largura. Cerca de metade da área é surpreendentemente rasa com profundidade de menos de cinco metros. A parte mais profunda se estende por 20 km na direção norte-sul da área de entrada da baía, para a área entre a ilha do Governador, a maior de todas as ilhas, e a ilha de Paquetá, e se constitui de um enorme canal com largura média de 2,5 km e uma profundidade de cerca de 15m. Este canal controla as trocas de água entre o oceano e a baía. Foi para recuperar o ecossistema da região (que abrange 16 municípios do Estado do Rio) que o governo do Estado lançou, em 1994, o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG).


A primeira fase do PDBG foi marcada pela ambição e grandiosidade. Ao captar parte do investimento necessário (total de US$ 991 milhões) no exterior, o programa ganhou projeção internacional. Do total, US$ 350 milhões são financiados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), US$ 244 milhões pela agência de cooperação internacional Japan Bank e US$ 396 milhões oriundos do Governo do Estado do Rio de Janeiro. Hoje, de acordo com a assessoria do Meio Ambiente, parte dos recursos para a contrapartida do estado está sendo custeada com a publicação da previsão orçamentária para utilização de recursos, da ordem de R$ 92 milhões, do Fundo de Combate à Pobreza. Novos empréstimos junto ao Banco Japonês, da ordem de R$ 100 milhões, já haviam sido negociados pela administração anterior com o mesmo fim.


Baía de promessas
Lançado durante a administração de Leonel Brizola, o PDBG I foi facilmente incorporado no campo das promessas. A expectativa da população era tamanha. Calcula-se que até agora tenham sido gastos cerca de R$ 1,5 bilhão. A poluição na baía, no entanto, continua.


De acordo com o deputado Alessandro Calazans (PV), presidente da CPI da Baía, há obras que foram entregues fora das especificações contratuais e, por isso, até hoje não funcionam.


A Usina de Lixo de São Gonçalo e Estação de Tratamento de Esgoto, as Etes, de lá não puderam funcionar até hoje porque estão fora das especificações.


Os oito reservatórios de água, prontos há cinco anos, continuam vazios. Só nos reservatórios os gastos correspondem a R$ 60 milhões. Na época, o gestor não fez os estudos suficientes para identificar como levar a água até os reservatórios. Isso é uma aberração”, denuncia o deputado.


A maior indignação fica por conta dos cerca de R$ 130 milhões gastos nas Etes de Alegria, Pavuna e Sarapuí, dos quais R$ 70 milhões foram investidos nas duas últimas e R$ 60 milhões na Ete Alegria. Como estas ETE}s funcionam hoje com apenas 15% da sua capacidade, todo o esgoto continua sendo despejado in natura na baía.


As denúncias sobre o mau uso do dinheiro público começaram em maio do ano passado, logo após a posse da governadora Benedita da Silva. Na época, o secretário de Saneamento e Recursos Hídricos, Agostinho Guerreiro, trouxe a público as irregularidades cometidas por gestões anteriores. O gesto provocou muitas críticas dos ambientalistas que questionavam até que ponto o então novo governo não compactuou com o silêncio durante a gestão de Anthony Garotinho. A principal razão para a desconfiança era o fato da vice-governadora na época ter sido Benedita da Silva.


Novas denúncias
Hoje, a CPI da Baía também está apurando novas denúncias. A mais grave é a de que a prática de aditamentos e re-ratificações contratuais elevou em até 25% os valores do PDBG. “Trata-se de instrumentos de exceção e não devem ser utilizados como regra. Estamos intimando os diretores da Assessoria de Desenvolvimento e Gestão (Adeg), órgão responsável pelo PDBG; ex-presidentes da Cedae e as empresas contratadas. Nosso relatório final irá encaminhar o indiciamento conforme a legislação penal sobre o mau uso do dinheiro público”, afirma.


As punições podem variar desde a prisão preventiva (caso confirme denúncia sobre uso de propina contra diretores da Adeg) até afastamento do serviço público e/ou ressarcimento do dinheiro ao erário. A CPI da Baía deverá funcionar até junho, com possibilidades de prorrogação.


Embora o PDBG I esteja se revelando um fiasco em termos de administração pública, o governo do Estado do Rio já está negociando a segunda etapa do programa. Em março, a governadora Rosinha Garotinho reuniu-se com o presidente do BID, Enrique Iglesias, e conversaram sobre a manutenção do financiamento do banco no PDBG II, cujo orçamento total deverá chegar a US$ 402 milhões.
A prioridade da próxima fase, conforme anunciou secretário do meio ambiente e vice-governador, Luis Paulo Conde, será a destinação do lixo urbano.
(Esta reportagem continua na próxima edição)


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