Amianto: manipulação de diagnóstico

18 de setembro de 2008

Para Fernanda Gianassi, auditora fiscal do Ministério do Trabalho, a Sama tem oferecido acordos extrajudiciais, com valores que variam de R$ 5 mil a 25 mil, mas os critérios nunca são claros. Ela encontrou laudos médicos assinados por médicos-professores da Universidade de Campinas, Unicamp e USP, que trabalham para a Sama. “Curiosamente alguns registram a… Ver artigo

Para Fernanda Gianassi, auditora fiscal do Ministério do Trabalho, a Sama tem oferecido acordos extrajudiciais, com valores que variam de R$ 5 mil a 25 mil, mas os critérios nunca são claros. Ela encontrou laudos médicos assinados por médicos-professores da Universidade de Campinas, Unicamp e USP, que trabalham para a Sama. “Curiosamente alguns registram a doença – a asbestose, ou o mesotelioma (um tipo de câncer) – mas não fazem o óbvio, que é associá-la com a atividade profissional do paciente, assim retiram a responsabilidade da empresa. Sem os registros, os trabalhadores não têm acesso aos benefícios da Previdência e muito menos o Ministério da Saúde pode ensejar ações de caráter preventivo as doenças do amianto”. Fernanda denunciou os médicos ao Conselho Regional de Medicina de São Paulo e às comissões de ética das respectivas universidades.
As condições de trabalho na antiga mina não eram nada boas. Os trabalhadores não tinham equipamento de proteção, viviam em meio à poeira de amianto, faziam operações arriscadas (como se pendurar no precipício para quebrar pedra ou botar dinamite). 
As crianças filhas de operários recebiam uma tarefa especial da Sama: com um pequeno martelo deviam quebrar a pedra que o moinho não aproveitara para retirar a fibra. Ao final, ficavam contentes por receber alguns centavos, suficiente para comprar um confeito pelo serviço realizado. As brincadeiras das crianças era pular nas dunas de amianto ou escorregar sobre um tobogã de terra improvisado, despencando sobre um monte de pó de amianto. Branquinhas e felizes não imaginavam que estavam lidando com uma fibra assassina.
Hoje o amianto está por toda parte. Como as doenças só se manifestam até 30 anos depois, o poder público não parece interessado em resolver o problema, mas adiá-lo, talvez, até o dia em que a doença atinja a todos. Nesse dia Bom Jesus da Serra vai se tornar o maior cemitério do Nordeste. (DL)


Fernanda Gianassi, Auditora fiscal do Ministério do Trabalho


 


 


 


 


Ninguém se mexe


Câmara Federal criou uma agenda para visitar todos os setores ligados à questão do amianto no Brasil.


No final do ano passado foi criada na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados um Grupo de Trabalho para avaliar a situação do amianto no Brasil. O GT é formado pelos deputados Rebecca Garcia (PP-AM), coordenadora, e Edson Duarte (PV-BA), relator; Dr. Nechar (PV-SP), Givaldo Carimbão (PSB-AL); Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) e Antonio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP).
O GT criou uma agenda que inclui visita a todos os setores ligados à questão do amianto no Brasil. A primeira atividade do Grupo foi visitar a mina abandonada da Sama em Bom Jesus da Serra (8 a 10 de setembro). Uma visita emblemática. A mina abandonada é uma catástrofe do passado que permanece viva, prevendo catástrofes futuras. Tudo porque, apesar dela ter encerrado suas atividades nada foi feito pelas autoridades públicas.
Ninguém se mexeu para reduzir o problema, para evitar novas contaminações, para informar o óbvio para a população: aquilo mata. O caso merece uma tese de doutorado: nunca se viu tanta omissão do poder público (na instância federal, estadual ou municipal) para um problema dessa magnitude. O que há, aqui e ali, são umas poucas pessoas que estão no serviço público e, mesmo com a resistência política e tecnocrata do estado (“isso vem de outra administração”), botam disposição e conhecimento para tentar resolver o caso.
A mina abandonada é isso mesmo: um exemplo claro de como o Estado abandona um lugar, as pessoas, o mundo, lavando as mãos diante de um crime e de um morto que não morreu. (DL)


 


O que fazer?


Não é preciso ser especialista para perceber que há necessidade de ações urgentes, de curto prazo, e ações de médio e longo prazo. Neste momento, o mais urgente é, através de campanha, esclarecer a população sobre os riscos do amianto. Placas deveriam ser colocadas junto aos locais de maior incidência de público (lago e proximidades), alertando para os perigos da água e da fibra.
É necessário também, de imediato, cercar a área para impedir o trânsito de pessoas ou animais. Para recuperar a área seria necessário juntar os resíduos num só local, cobrir a área devastada com uma camada de solo, e estimular a recuperação da mata nativa no lugar.
A médio e longo prazo seria necessário aprofundar os estudos sobre o lugar e as pessoas, numa ação integrada das mais diversas instituições de pesquisa. Poderia ser criado um grupo técnico-científico, com representantes da sociedade para elaborar e implementar um programa de recuperação da área degradada, estabelecer programa de prevenção de doenças do amianto, programa de assistência aos expostos ao amianto, programa ecológico que tratasse de todo ecossistema. (DL)