QUE PESADELO!

Rodovia clássica mata estrada turística

20 de dezembro de 2012

  Nas chuvas de dezembro, a estrada turística – que deveria servir também aos caminhantes, cavaleiros e ciclistas – não suportou a incompetência dos serviços de engenharia. Tudo devido às obras de contenção, aos cortes e aos aterros desnecessários.   O que se vê hoje no Serro, nos arredores da BR-259, é a construção de… Ver artigo

 

Nas chuvas de dezembro, a estrada turística – que deveria servir também aos caminhantes, cavaleiros e ciclistas – não suportou a incompetência dos serviços de engenharia. Tudo devido às obras de contenção, aos cortes e aos aterros desnecessários.

 

O que se vê hoje no Serro, nos arredores da BR-259, é a construção de uma verdadeira auto-estrada, com finalidade muito mais rodoviária do que turística. Começa a se constituir, nitidamente, um atalho rodoviário entre Diamantina e Serro. Pior ainda: esse atalho, com o futuro asfaltamento do segmento Serro-Conceição do Mato Dentro da MG-010, será capaz de substituir a BR-259 e a BR-367 como a principal via de ligação regional. 

Surge então uma resposta errada para uma bela pergunta: como melhorar as condições de circulação em uma região ímpar, beneficiando de imediato seus habitantes, fomentando sua visitação com uma melhor integração aos demais segmentos da Estrada Real e, dessa forma, abrindo uma alternativa real e sustentável de desenvolvimento? Infelizmente, uma resposta errada está sendo adotada: constrói-se uma ligação rodoviária regional, adotando-se para tanto, os padrões clássicos da engenharia rodoviária. 
 
Prejuízos com impactos ambientais e históricos
 
Muitos prejuízos dessa opção podem ser anotados.
O investimento de recursos públicos escassos, com a execução de cortes, aterros e obras de contenção, desnecessários em uma obra de menor porte.As placas instaladas na região da obra indicam um investimento inicial – fora os eventuais aditivos, comuns no Brasil – de quase R$60 milhões. Os impactos ambientais da obra rodoviária clássica são de magnitude muito maior do que os impactos decorrentes da adoção de uma alternativa bem pensada: movimentação e disposição de material e exposição de solo e subsolo causam assoreamento de cursos d’água, intrusão visual e erosão. 
É grande o impacto sobre o patrimônio histórico da região: no caminho da estrada estão pelo menos quatro vilarejos coloniais (Três Barras, Milho Verde, São Gonçalo do Rio das Pedras e Vau), que terão de suportar o tráfego de passagem, já que não há notícias da construção de variantes de contorno. As edificações – que incluem bens tombados pelo Patrimônio Histórico – evidentemente sofrerão com o tráfego de passagem. 
No entanto, o maior prejuízo está na própria presença de uma rodovia “padrão”, cruzando as montanhas e entrando nas vilas. Se hoje a região pode ser vista, ainda que em potencial, como um “destino” turístico peculiar, diferenciado dentro do conjunto de destinos nacionais, a rodovia tende a banalizá-lo. Teremos assim, apenas, mais um destino, em meio a tantos e tantos outros… 
E onde está a lógica que constitui a Estrada Real, na qual podem e devem conviver caminhantes, cavaleiros, ciclistas e veículos a motor? Aonde ela foi parar, nesse projeto? Também deve ser dito que a Estrada Real – e esse trecho entre Serro e Diamantina não é exceção, pelo contrário – constitui em si algo a se visitar, sendo então ela própria parte do destino. Não se trata de transportar o turista até o destino, como sempre acontece. 
As soluções esperadas e convenientes para essa ligação, quando buscamos de fato uma resposta coerente para a pergunta inicial, envolvem na verdade um conjunto de intervenções: melhoria ou reconstrução de pontes, construção de sistemas de drenagem, sinalização, instalação de soluções e dispositivos para controle de velocidade, adequação às necessidades de caminhantes, ciclistas e cavaleiros, tratamento das travessias das vilas (com eventual construção de pequenas variantes), controle e recuperação dos focos de erosão, e recobrimento do leito da estrada com pisos variados, adequados a cada caso. 
As máquinas já funcionaram, e muito já se perdeu, mas talvez ainda haja tempo para se adotar um rumo mais inteligente, mais adequado ao meio ambiente e mais compartilhado com a natureza. 
 
(*) Paulo André Barros Mendes é jornalista e Geografo.