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Cidades enfrentam o desafio do planejamento

19 de maio de 2019

    Chicago está entre as cidades que já começam a levar em conta o zoneamento integrado — Foto: Pixabay       A caminho do local onde eu tinha marcado para encontrar Ilan Cuperstein, vice-diretor regional da organização de cidades C40, um mega condomínio está acabando de ficar pronto. Chamou minha atenção porque é… Ver artigo

 

 

Chicago está entre as cidades que já começam a levar em conta o zoneamento integrado — Foto: Pixabay

Chicago está entre as cidades que já começam a levar em conta o zoneamento integrado — Foto: Pixabay
 
 
 
A caminho do local onde eu tinha marcado para encontrar Ilan Cuperstein, vice-diretor regional da organização de cidades C40, um mega condomínio está acabando de ficar pronto. Chamou minha atenção porque é bonito, e pela quantidade de apartamentos que possui. Eu estava a pé e fiquei imaginando: quando tudo estiver habitado, quantas pessoas a mais estarão circulando por aquela rua de Botafogo, já tão superlotada? Quantos carros a mais? E a rede de esgoto, terá capacidade? Haverá coleta consciente dos resíduos?
 
Toquei nesse assunto durante a entrevista com Ilan e fiquei sabendo, por ele, que já existem cidades no mundo com um zoneamento integrado. É o que seria preciso para que uma estrutura daquela envergadura não causasse tanto impacto negativo numa região já tão populosa. Portland, Chicago, Cidade do Cabo, Buenos Aires, já começam a levar em conta este planejamento, necessário para que o espaço urbano não expulse as pessoas mais do que as agregue.
 
O Rio de Janeiro, infelizmente, não tem isso. E vamos continuar a lidar com os excessos – de carros, de prédios, de poluição, de resíduos, de caos no trânsito – até que a questão do ambiente em torno passe a ter peso; que a especulação imobiliária encontre limites em políticas públicas, como já acontece em outras cidades. Não se trata de limitar o número de habitantes em cada cidade, mas de organizar a região urbana para que se tenha qualidade de vida.
 
Seguimos conversando sobre este e outros tantos aspectos deste imenso desafio que são as cidades, onde mais da metade da população mundial decidiu morar, não por acaso. O C40 é uma organização híbrida que recebe doações de instituições filantrópicas. “É uma rede de cidades para cidades”, explica-me Cuperstein. Seu maior desafio, e o maior ganho para as cidades que dela fazem parte – hoje são 94, e o Rio de Janeiro está entre elas – é possibilitar aos prefeitos que troquem informações, aprendam uns com os outros.
 
 
Abaixo, a íntegra de nossa conversa:
 
 
O que são as cidades C40?
 
Ilan Cuperstein – A ideia é que elas sejam líderes na luta contra as mudanças climáticas ou a favor de ações climáticas, tanto na mitigação quanto na adaptação. É uma rede que tanto apoia o intercâmbio de informações entre elas quanto, hoje, também oferece apoio técnico para alguns projetos. A prefeita de Paris, Anne Hidalgo, atual presidente da C40, fez uma série de ações ambiciosas, entre elas tornar o centro da cidade livre de combustível a diesel. Em tudo isso, o C40 ajuda.
 
 
O Rio de Janeiro faz parte da C40, o ex-prefeito Eduardo Paes chegou a ser presidente até 2017. A cidade pode ser líder em mitigação ou preservação?
 
Ilan Cuperstein – O Rio fechou, em 2012, o maior aterro sanitário da América Latina, em Jardim Gramacho e construiu o de Seropédica, que é um centro de referência (houve um entrave da atual prefeitura para levar adiante o projeto. As ciclovias também foram uma boa ação: hoje o Rio está entre as cinco cidades da América Latina com maior rede de ciclovias.
 
Os BRTs desafogaram o trânsito e estão permitindo que muitos moradores da Zona Oeste tenham duas horas a mais do dia, antes perdidas em trânsito. Isto é inclusão social. Na questão das chuvas, sim, o Rio precisa avançar e muito, na adaptação. Mas, em termos de resposta, a cidade já melhorou bastante, com a equipe do Centro de Operações do Rio (estou falando das sirenes espalhadas nas comunidades e da quantidade de dados).
 
 
 
O Rio de Janeiro faz parte da C40 — Foto: Pixabay
 
O Rio de Janeiro faz parte da C40 — Foto: Pixabay
 
 
 
 
Isto ainda é difícil, né? Há uma distância – e aí já estou falando em termos mundiais também – entre tudo o que se resolve sobre o meio ambiente em encontros, fóruns, reuniões e o que verdadeiramente é feito para melhorar a vida dos cidadãos nas cidades.
 
Ilan Cuperstein – Ainda tem muitos que consideram a questão ambiental como um entrave ao desenvolvimento. Mas, na verdade, se não se cuidar do meio ambiente a região não vai se desenvolver. E as cidades, neste sentido, têm desempenhado um papel de liderança. Quem está na ponta são os prefeitos, eles são cobrados.
 
Fazemos pesquisas com o que chamamos de "cobenefícios", ou seja, como as ações climáticas devem caminhar junto com os benefícios sociais. Por exemplo: se você muda os motores de ônibus numa cidade, quantos atendimentos deixa de fazer nos hospitais, com pessoas que chegam lá por causa de doenças provocadas pela má qualidade do ar?
 
 
O que é uma cidade sustentável?
 
Ilan Cuperstein – A C40 não trabalha com esta definição. Pensamos sempre em qual o grande projeto que pode colocar as cidades numa posição ambiciosa? Existe, por exemplo, um Compromisso Prazo 2020, que foi assinado por prefeitos de 72 cidades comprometendo-se a fazer um plano de ação climática, que depois vai ser implementado, para botar as cidades numa rota para zero emissões líquidas até 2050.
 
 
Até 2020 tem que ter o plano, e a gente na verdade verifica se os planos de fato levam à neutralidade em emissões. Por exemplo: mudar a rota de desenvolvimento urbano, eletrificar todo o transporte, ou diminuir o resíduo que vai para o aterro a zero.
 
 
O Rio assinou este Compromisso? E já entregou o Plano?
 
Ilan Cuperstein – Sim, assinou em 2017, mas ainda não entregou o plano.
 
 
Quando eu vinha caminhando para cá vi um condomínio imenso que está quase pronto. Vai complicar muito a vida de uma região já bastante populosa. Como evitar isso?
 
Ilan Cuperstein – Há cidades que têm um zoneamento integrado, ou seja, quando vão construir um prédio cruzam três níveis de informação pra ver se ali é lugar pra construir. Tudo é levado em conta: o que significa para a infraestrutura, o projeto de coleta de resíduo, de água.
 
É necessário muita capacidade e muito recurso porque tem que ter todas as informações, tem que ter pessoal capacitado para isso. Para um planejamento orientado de transporte, o prédio tem que ser mais próximo de um corredor de transportes. Curitiba é um modelo disso.

 

 

Em São Francisco, nos Estados Unidos, toda nova construção precisa ter uma proporção em habitação social — Foto: Pixabay

Em São Francisco, nos Estados Unidos, toda nova construção precisa ter uma proporção em habitação social — Foto: Pixabay
 
 
 
 
Nessas cidades, as construtoras já sabem que terão que cumprir regras para este planejamento?
 
Ilan Cuperstein – Sim, e há uma espécie de prêmio: aquelas que constroem perto do corredor de transporte vão poder construir um prédio de 15 andares, por exemplo. Mas se quiser se distanciar, já vai ter que diminuir isto. Várias cidades já fazem assim: Portland, Chicago, Cidade do Cabo, Buenos Aires… Em São Francisco, por exemplo, toda nova construção precisa ter uma proporção em habitação social, e há uma exigência para que se construa infraestrutura urbana para aquelas pessoas.
 
Na hora de construir, precisa saber o impacto, e a construtora tem que entrar nessa equação porque ela está criando uma demanda e tem que arcar com esse custo, porque senão o custo é pago pela sociedade. Ela lucra construindo um condomínio num local valorizado, mas tem que participar. Além disso, a população tem que entender também que talvez exista uma demanda por moradia, mas que não vai ser ali que vai poder subir um prédio de dez andares.
 
 
Você tocou num ponto importante: a participação dos cidadãos. Acha que as cidades estão muito cheias? Gosta da ideia de se limitar número de habitantes?
 
Ilan Cuperstein – Gente também pode ser solução. As cidades agregam muitos recursos. Os problemas passam pelas cidades, mas os grandes centros de pesquisa estão nas cidades, as grandes empresas que também têm que fazer parte das soluções, as grandes universidades, as mobilizações sociais.